Aqui e ali, em Utopia e Barbárie, Silvio Tendler fala a verdade. É nos momentos em que insere sua autobiografia no cortejo de eventos e reflexões sobre o beco sem saída das ideias de esquerda desde a II Guerra Mundial até os dias de hoje. Quando coloca a si mesmo como instância enunciadora, com sua carga pessoal de esperanças e decepções, Silvio confere ao filme uma emoção legítima, que nenhuma ordenação de materiais de arquivo, depoimentos e narrações é capaz de substituir.
É claro que Silvio está falando a sua verdade o tempo todo através das cabeças pensantes que ouviu ao longo dos muitos anos de preparação desse doc. É óbvio que, para todos os que sonham com uma sociedade justa, conta muito o que falam Fernando Solanas, Francesco Rossi, Gillo Pontecorvo, Denys Arcand, Eduardo Galeano, Amir Haddad, Jacob Gorender, Dilma Rousseff, Susan Sontag, Marlene França, Marceline Loridan e tantos outros. Mas a verdade que se ouve o tempo todo é uma verdade genérica, conceitual, praticamente indiscutível. Falta a verdade do filme, que comparece (de verdade) nas colocações do diretor em primeira pessoa.
Utopia e Barbárie é movido pelo inconformismo de Silvio Tendler para com os rumos que o pensamento utópico tomou na atualidade. As referências à pulverização das causas entre os jovens de hoje e as cenas de um Vietnã ocidentalizado e privatizado ilustram claramente um desapontamento. Mas esse inconformismo tende a se diluir numa mera cronologia de fatos, numa aula ilustrada de História com viés ideológico definido.
É péssimo procedimento crítico lamentar o que um filme não é. Mas não resisto a imaginar quão mais poderoso seria Utopia e Barbárie se o cineasta tivesse mergulhado sua voz, sua imagem, enfim, sua pessoa no fluxo de anotações e encontros que está nos oferecendo. Do jeito que estão, as anotações soam como afirmações peremptórias e os encontros, como simples depoimentos.
E agora??? Quem diria, temos um ponto de vista em comum (apesar de minha ignorância em relação ao seu conhecimento sobre cinema) também gostaria que o Sílvio Tendler tivesse se colocado mais no filme. Que inclusive fosse sua a voz que narra todo esse painel histórico.
Adoro o documentário dele “Fragmentos do Exílio” que você deve ter visto. Acho que o Sílvio trabalha muito bem com as emoções neste filme, que é um curta.
Gostei muito do seu jeito de escrever, Mario, voltarei ao seu site. Obrigada!
Forte abraço