Mais um (belo) “filme Isabelle Huppert”

A PRISIONEIRA DE BORDEAUX

Já é tempo de admitirmos: existe um subgênero do cinema francês que responde por Isabelle Huppert. Filmes “Isabelle Huppert” giram em torno de uma mulher de personalidade forte, imprevisível, um pouco maluquete e capaz de dominar inteiramente o seu entorno. Como Alma Lund, a burguesona que visita o marido preso por um atropelamento com morte em A Prisioneira de Bordeaux (La Prisonnière de Bordeaux). Na penitenciária, ela se penaliza com Mina (Hafsia Herzi), mulher pobre que também visita o pai de seus filhos.

Alma sente falta de companhia e convida Mina e as crianças para compartilharem sua grande mansão em Bordeaux recheada de obras de arte. O interesse de Alma desperta curiosidade, uma vez que ela se mostra extremamente acolhedora e passa a dividir os cuidados com os filhos de Mina. Mas não lhe passa despercebido, desde o início, que Mina é capaz de mentir, ainda que pateticamente.

Alma e Mina vivenciam formas análogas à prisão. Alma, pelo laço conveniente com um marido canalha que lhe presenteia com um quadro em troca de frequentes traições. Mina, pela dívida de roubo que lhe rende as ameaças de um comparsa do marido. A maneira tortuosa como essas duas mulheres vão se ajudar, inclusive nas respectivas libertações, é o grande atrativo do filme de Patricia Mazuy.

Diante da câmera estão duas atrizes muito diferentes, com todo o estranhamento que suas personas e personagens sugerem. Hafsia/Mina, com uma suavidade ambígua que se revela inteira quando sob pressão. Isabelle/Alma, com uma ironia soberana a encobrir uma profunda carência. Entre esses dois polos, A Prisioneira de Bordeaux desenha um arco cômico-dramático envolvente, com belas surpresas quanto aos limites da amizade e da lealdade.

Mas é Isabelle, com sua presença desconcertante, quem dá as cartas. É fácil perceber que ela dirige a si própria em cena. E o imponderável de sua atuação às vezes contagia os enquadramentos e mesmo a montagem. A personalidade da atriz parece afetar todos os departamentos criativos da produção. Afinal, trata-se de um “filme Isabelle Huppert”.

>> A Prisioneira de Bordeaux está nos cinemas.

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