QUANDO O BRASIL ERA MODERNO
por Paulo Lima
Numa cena do documentário Quando o Brasil era Moderno, menção especial no É Tudo Verdade, alguém pergunta quando o nosso país trocou o modernismo pelo “burrismo”. A tentativa de resposta envolve uma longa discussão que tem como pilar a Arquitetura. E é através da Arquitetura que o documentário dirigido por Fabiano Maciel repassa um vão de tempo da nossa história, quando éramos modernos, ou nos julgávamos destinados a um futuro radioso.
O filme é baseado no livro Moderno e Brasileiro, de Lauro Cavalcanti, resultado do seu doutorado em Antropologia Social. Ao retratar a revolução estética vivida pela arquitetura moderna brasileira entre os anos 1930 e 40, atingindo o ápice nos anos 1960 com a construção de Brasília, o documentário acaba funcionando como uma aula sobre o Brasil, tendo por base os movimentos arquitetônicos como reflexo da batalha das ideias.
Depoimentos de arquitetos como Paulo Mendes da Rocha, Lúcio Costa e Oscar Niemeyer (sobre quem Maciel já dirigiu o documentário A Vida é um Sopro), e de historiadores, críticos de arte e sociólogos expõem a grande disputa que norteava as ideias em busca de uma arquitetura tipicamente brasileira. Nos anos 1930, essa disputa se dava entre uma adesão ou ao neocolonial, ou ao modernismo importado da Europa, tendo a influência de arquitetos como o francês Le Corbusier e o russo Gregori Warchavchik, criador da primeira casa modernista de São Paulo.
A nova arquitetura mudou o frontispício do Rio de Janeiro, então capital federal, entre 1930 e 1940, sob o impulso do Estado Novo de Getúlio Vargas, conduzindo à construção de grandes projetos públicos, como o Ministério da Educação e Saúde na gestão do ministro Gustavo Capanema.
O documentário mostra que a tentativa de implantar o moderno entre nós enfrentou resistências da parte dos conservadores, que consideravam a presença dos modernistas uma “perversão da identidade nacional”. Esse esforço de ruptura com o passado era perseguido por novas ideias na educação (Anísio Teixeira), no cinema (Glauber Rocha), na literatura (Carlos Drummond de Andrade), na música (Heitor Villa-Lobos) e no paisagismo (Burle Marx), com a Arquitetura também refletindo a luta ideológica.
Éramos modernos, embora inseridos num processo de modernidade incompleta, como mostra a construção de Brasília, explorada na abertura do documentário, que acabou evidenciando que a crise de moradia se mantinha como um problema crônico do país. E quando deixamos de ser modernos? Quando nosso projeto nacional desenvolvimentista foi interrompido pelo golpe militar de 1964, asseguram alguns depoimentos. Os cacos ainda estão por aí sendo recolhidos.
Paulo Lima
Leia entrevista de Fabiano Maciel a Alysson Oliveira no site Cineweb.
>> Quando o Brasil era Moderno está nos cinemas.

