Do que estão rindo (ou estavam até há pouco) os espectadores brasileiros, argentinos, espanhóis, russos, ucranianos, canadenses e de mais 12 países? Um esboço de resposta pode estar no 1º Festival Internacional de Cinema de Humor, que ocupa a tela da Cinemateca do MAM-Rio a partir de amanhã, 7/12, e até o dia 16. Veja detalhes e programação no site do evento.
Iniciativa corajosa do produtor Flavio Machado, responsável por várias edições do festival Ver Cine, o FINTCH visa ocupar uma lacuna na oferta dedicada à comédia mundial. A programação se compõe de 61 curtas e três longas-metragens. A abertura fará homenagem a Buster Keaton com os curtas Day Dreams (1922) e O Aeronauta (1923), acompanhados por piano ao vivo.
Entre os curtas brasileiros, Ela Que Mora no Andar de Cima, de Amarildo Martins, traz Marcélia Cartaxo no elenco, enquanto À Espera do Chock, de Rogerio Boo e Jorge Lepesteur, é estrelado por Grace Gianoukas e Edgard Scandurra. Completam a lista de curtas nacionais Atitude Suspeita, de Pietro Sargentelli, Diagnóstico, de Gabriela Camargo, Estática, de Gabriela Queiroz, Os Antissociais, de Gabriel Silva, e Tarja Preta, de Nícolas Sanches Martins.
Todos participam da mostra competitiva, que vai premiar os vencedores em três categorias: Melhor Longa Metragem, Melhor Curta Brasileiro e Melhor Curta Estrangeiro. A escolha será feita por um júri composto por formandos em Cinema da Universidade Federal Fluminense (UFF).
Deficientes visuais e deficientes auditivos terão a oportunidade de conhecer de perto as produções nacionais selecionadas para o festival. No dia 8 de dezembro, às 15h, os filmes serão exibidos com recursos de acessibilidade.
O craque Fabio Vellozo, coordenador de pesquisa e documentação da Cinemateca do MAM, vai ministrar a palestra “A Comédia no Cinema Brasileiro” no dia 15/12, às 15 horas.
Cada um com (ou sem) seu humor
O blog já teve oportunidade de assistir aos três longas-metragens selecionados, provenientes de Argentina, Rússia e Ucrânia.
Dos hermanos argentinos vem a comédia gótica El Cuento del Tío. O título se refere a uma expressão usada para definir um golpe em que se aproveita da ingenuidade e/ou da cobiça de outros. No filme de estreia do diretor Ignacio Guggiari, uma família em apuros financeiros se reúne na noite de Natal à espera de um tio rico que poderá ajudá-los. Um acidente muda os planos do grupo, que passa a simular um sequestro e exigir resgate. O elenco garante a graça um tanto “grossa” do filme, mas que em geral funciona. São muitos quiproquós com a participação de parentes disfuncionais, uma empregada boliviana, dois policiais oportunistas e uma viúva crédula demais. O maior senão é a resolução explicada nos minutos finais, apelando a uma versão paralela e oculta da história. Ainda assim, a coisa é bem divertida nos padrões do gênero.
El Cuento del Tío passa no dia 15/12, às 19h.
O russo Sem Vergonha (Babki/Shameless) explora os contrastes gritantes entre seus personagens. Uma ex-professora de esgrima idosa e solitária é assaltada depois de sacar sua pensão e vem a ser procurada pela mãe do assaltante. Na mesma ocasião, seu apartamento é invadido por duas prostitutas perseguidas pela polícia e pelos cafetões. Em seu primeiro longa-metragem, o diretor Nikita Vladimirov não se afasta muito dos clichês desse tipo de comédia em que pessoas muito diferentes interagem por obra do acaso. O filme tem jeito de sitcom, com momentos bem engraçados entre outros de comicidade frustrada. De qualquer forma, é um exemplo curioso do humor popular que se faz hoje na terra de Putin, sempre na fronteira entre legalidade, contravenção e humanismo patético.
Sem Vergonha passa no dia 16/12 às 19h.
A escolha mais discutível da curadoria foi o ucraniano Servos Inglórios (Bezslavni kripaky), de Roman Perfilyev, vendido como paródia de Bastardos Inglórios, de Quentin Tarantino. Com alusões também a Kill Bill, Django e até Cães de Aluguel. O problema é que faltou o principal para ser um filme de humor: humor. Ou talvez seja um tipo de humor ucraniano baseado em estereótipos étnicos. A história se passa em meados do século XIX, quando servos espoliados ensaiavam uma revolta contra seus senhores. O herói é um ucraniano formado como samurai, que se alia a um poeta (referência a Taras Shevchenko, fundador da moderna literatura ucraniana) empenhado em resgatar sua amada, sequestrada por um senhor de terras cruel. A trama é tola e inclui um judeu mefistofélico, traficante de armas, veículo de um antissemitismo histórico na Ucrânia. O filme é relativamente bem feito, bem fotografado, com boas cenas de luta descabelada, e os atores não são ruins. Mas a violência explícita e os clichês não são espirituosos, nem me pareceram caber no gênero da comédia.
Servos Inglórios passa no dia 11/12 às 18h15.