Pasolini e Rossellini em documentários

Notas de Paulo Lima sobre os filmes LOCAÇÕES NA PALESTINA, de Pasolini, e ROBERTO ROSSELLINI, MAIS QUE UMA VIDA, no Festival de Cinema Italiano

O evangelho segundo Pasolini

Em 1965, o diretor italiano Pier Paolo Pasolini viajou à Palestina com o objetivo de procurar locações para seu filme O Evangelho Segundo São Mateus.

Pasolini registrou os passos da sua peregrinação, que acabou se transformando no documentário Locações na Palestina (Sopralluoghi in Palestina per il vangelo secondo Matteo), uma espécie de diário de viagem.

Nas suas andanças, Pasolini tem como guia o padre italiano Dom Andrea, que apresenta ao cineasta os caminhos originais por onde passou Jesus Cristo.

Pasolini se desaponta com o que encontra nos seus deslocamentos pelos territórios históricos da Galileia, Jordânia, Jerusalém. Ora se depara com o excesso de miséria, ora de cor, ora com a modernidade de alguns lugares.

À visão religiosa de Dom Andrea, ele contrapõe sua visão estética, e esse contraste entre os dois mundos gera certa graça narrativa.

Pasolini interage com as populações locais, mostrando-se um observador atento e bom repórter.

A despeito de certa monotonia, o documentário, narrado pelo próprio Pasolini, tem inestimável valor pela qualidade do texto poético do diretor e por se constituir numa rara oportunidade de vê-lo expor suas premissas artísticas.

Não bastasse isso, somos defrontados com imagens de uma região que gozava na época de paz aparente, completamente destroçada nos tempos atuais.

Pasolini acabou desistindo das locações palestinas, optando por reconstituir os cenários bíblicos e realizar seu filme na própria Itália.

>> Locações na Palestina pode ser assistido gratuitamente neste link.

Paulo Lima

O outro realismo de Rossellini

Na história do cinema italiano, o nome de Roberto Rossellini (1906-1977) costuma ser associado ao Neorrealismo. Rossellini realizou alguns dos grandes clássicos daquele movimento cinematográfico que buscava retratar a realidade do pós-Guerra, como Roma, Cidade Aberta, Alemanha, Ano Zero e Paisà.

No entanto, o universo estético do diretor transcendeu o Neorrealismo, como mostra o documentário Roberto Rossellini, Mais que uma Vida“.

O filme se detêm em 1956, um ano aziago na vida do cineasta, quando ele enfrenta uma crise criativa e pessoal. Seu casamento com a atriz sueca Ingrid Bergman tinha terminado, e ele passava por uma crise criativa. Seus interesses artísticos buscavam outros horizontes além do Neorrealismo.

Rossellini recebe então um convite do primeiro-ministro indiano Jawaharlal Nehru para fazer o documentário Índia, Mãe Terra.

Na Índia, além da reviravolta em sua carreira, Rossellini sofrerá uma guinada na sua vida amorosa, ao se apaixonar e casar com a indiana Sonali DasGupta. A partir dessa mudança de ares, um novo Rossellini irrompe, tal como o vulcão de Stromboli, centro do filme famoso estrelado por Ingrid Bergman.

Estruturado a partir de imagens raras de arquivo, e baseado em depoimentos e entrevistas de Rossellini, o documentário dos diretores Ilaria de Laurentiis, Raffaele Brunetti e Andrea Paolo Massara mostra um homem de energia inesgotável, que se lançava com a mesma paixão nos relacionamentos amorosos (teve quatro casamentos oficiais e dois não oficiais) e no cinema, cujas potencialidades ele procurou explorar, chegando a se dedicar à história e à ciência como objetos cinematográficos.

“Não me enamoro de nada, sou apaixonado por tudo”, revela Rossellini numa cena do filme. Em outro momento, Isabela Rossellini, filha do diretor com Ingrid Bergman, questiona se o pai seria gênio ou louco.

É a esse personagem extraordinário e sua paixão desmedida pela vida que somos apresentados nesse surpreendente documentário.

Paulo Lima

3 comentários sobre “Pasolini e Rossellini em documentários

  1. O filme ROBERTO ROSSELLINI, MAIS QUE UMA VIDA não consta no programa oficial do Festival de Cinema Italiano de 2025.

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