MORTO NÃO FALA
Padres, psicanalistas e advogados têm o dever do segredo. O que ouvem de seus fiéis, pacientes ou clientes deve permanecer entre eles, sob pena de uma quebra ética imperdoável. Essa obrigação recaía também sobre Stênio (Daniel de Oliveira), trabalhador noturno no necrotério do Instituto Médico Legal. Por razões nunca explicadas, Stênio tem o dom de ouvir os mortos. Somente aos seus ouvidos, os pobres cadáveres lamentam seu destino, praguejam contra a imobilidade, fazem pedidos e eventualmente contam coisas que não deveriam sair das quatro paredes da morgue.
Mas eis que o ciúme vai levar Stênio a romper o silêncio e detonar um rastilho de maldição sobre os personagens à sua volta.
MORTO NÃO FALA combina humor negro e sintagmas dos filmes de zumbi e de casa mal assombrada. O humor nem sempre é voluntário, mas o filme de Dennison Ramalho se equilibra bem na fronteira entre a comédia e o horror. Por exemplo, é tão engraçado quanto assustador ver os cadáveres falarem com voz trevosa enquanto movem somente os lábios e as pupilas. Ou as formas como a mulher de Stênio (Fabíula Nascimento) reaparece para reclamar sua vingança.
A boa fatura artesanal do thriller baseia-se muito fortemente na direção de arte, que só falha na simulação das peles cortadas dos mortos nas autópsias. De resto, é um filme de gênero eficiente, bem conduzido e muito bem interpretado. Não pretende trabalhar com grandes significados, nem tenta ser metáfora de nada, mas poderia ter sido extraído de um conto de Edgar Allan Poe.
Pingback: CARTA MAIOR CINEMA: CORPOS NEGROS IMPORTAM |
Pingback: Corpos negros importam | carmattos