Quatro músicos, um macaco e uma grávida de rock

Tive uma surpresa muito agradável com JERSEY BOYS: EM BUSCA DA MÚSICA. Clint Eastwood vem revisitando diversos gêneros clássicos do cinema americano, e esta não é sua primeira investida na biografia musical (“Bird”). A história de Frankie Valli e os Four Seasons tem vários ingredientes que costumam atrair o diretor: o preço do sucesso, a importância das tradições e dos compromissos, os laços de amizade, as relações entre vida profissional e vida pessoal. Embora tenha se baseado no mesmo material de um musical da Broadway, ele não optou por essa estrutura, a não ser na pitoresca cena dos créditos finais. Mas valeu-se de uma deliciosa comédia de máfia, que pontua a trajetória do quarteto, da ascensão à queda e ao retorno nostálgico. A família de Frankie fornece os elementos de melodrama que não poderiam faltar a um filme de Clint. As canções quadradas do grupo entram quase sempre como performances de palco, perfeitamente reencenadas pelos atores, três dos quais remanescentes do elenco original da Broadway. A crítica americana em geral não aprovou o resultado, mas, afora algumas “barrigas” do roteiro, tudo me pareceu irradiar simpatia e competência. O velho cavaleiro Eastwood, é bem sabido, não veio ao mundo para inovar. O que ele faz bem é servir às convenções da melhor maneira possível. “Jersey Boys” é um tributo às convenções do cinema e da música. Em nenhum momento quer levar-se muito a sério ou contar uma retumbante história de sucesso. Com essa medida, me divertiu e recompensou bem mais do que eu esperava.

Imagine um filme a meio caminho entre “Tainá” e “A Era do Gelo”. AMAZÔNIA, de Thierry Ragobert, está mais ou menos aí. A coprodução franco-brasileira conta a descoberta e progressiva aclimatação de um macaquinho urbano à selva amazônica depois da queda do avião em que viajava. Típico relato de sobrevivência, aprendizado e conquista amorosa, o filme combina didatismo e aventura em doses equilibradas. Há quem critique a narração e os diálogos (nem sempre) engraçadinhos sobrepostos às imagens para distribuição comercial, mas acho que funciona muito bem para envolver e interessar o público infantil sem incomodar muito os adultos. Qualquer estorvo nessa área é amplamente compensado pela perícia das filmagens e a beleza das imagens. Sem recorrer a animações, computadores ou efeitos especiais, tudo é resolvido pela encenação antropomórfica e uma captação extraordinária da fauna amazônica. Às vezes é difícil acreditar que estamos diante não de uma imagem fabricada, mas de um esplendoroso espécime animal real. Como alguém escreveu por ocasião do Festival de Veneza, o macaco protagonista tem mais variações de expressão do que muitos atores bem pagos. Menos ingênuo do que parece, Amazônia reencena a jornada do herói que sai do simulacro para abraçar seu habitat natural. É divertido, cativante e extremamente bem realizado.

A sinopse atraiu muita gente durante o Festival do Rio de 2012 para ver A FITA AZUL (Electrick Children): garota virgem de família mórmon fica grávida depois de ouvir um cassete de rock e sai à procura do autor, que ela acredita ter produzido o milagre. Tudo isso está lá como prometido, numa chave de fantasia adolescente para adolescentes. No fundo dessa parábola bíblica de brincadeirinha, o que se conta é uma história de amadurecimento sexual e procura inconsciente do próprio pai. Nada que precise passar por um divã, mas somente por uma rápida viagem a Las Vegas. O título faz trocadilho de Electric com trick (truque), o que não ajuda muito a desvendar o “mistério” contido no argumento. Esse é o primeiro longa da diretora e roteirista Rebecca Thomas, também ela criada na fé mórmon. O filme não chega a ser um rompimento com o puritanismo de suas origens, mas aborda o assunto com algum humor e picardia. A atriz Julia Garner é um bom trunfo para passar à plateia o misto de inocência e atrevimento da personagem. Sua única pista para encontrar o que procura é a baladinha Don´t Leave me Hanging on the Telephone, da banda The Nerves, dos anos 1970. Se ela não enjoar os ouvidos durante o filme, e se aquilo tudo não parecer uma rematada tolice, até que dá pra curtir.

3 comentários sobre “Quatro músicos, um macaco e uma grávida de rock

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