Elogio da geral

Prosseguindo no tema da vinculação entre futebol e política (Democracia em Preto e Branco), Pedro Asbeg se volta aqui para a extinção da geral do Maracanã em 2005. O documentário Geraldinos, dirigido em parceria com Renato Martins, começa como uma evocação nostálgica dos tempos em que o torcedor de muita paixão e pouco dinheiro assistia ao jogo em pé, bem pertinho do gramado, com a euforia e o sofrimento elevados ao cubo. Era uma festa de cantos, palavrões, lágrimas, danças malucas, fantasias e máscaras que o estádio viveu durante 55 anos.

Vemos isso através de imagens colhidas pelos próprios diretores e colaboradores em 2005, por ocasião dos 10 últimos jogos com geral, destacando-se o último Fla-Flu, além de cenas de arquivo de outras épocas. Lá estão figuras míticas como a Vovó Tricolor, o Índio da Geral e o Mister M, algumas delas estimuladas nos últimos tempos pela vaidade diante das transmissões de TV. Mas isso o filme não diz, pois não cabe nele discutir a geral, mas apenas louvá-la. E criticar sua eliminação no bojo das grandes reformas recentes do Maracanã.

A partir de certo ponto, Geraldinos vira uma tribuna para Marcelo Freixo, Romário e outros investirem contra – ou apenas deplorarem – a privatização, elitização e camarotização do estádio como parte do que Freixo define como “derrota de um projeto de cidade”. Imagens da maquete eletrônica do novo Maracanã são usadas com astúcia para sugerir o ambiente asséptico e pequeno burguês que resultou das mudanças, enquanto o povão foi expulso para supostamente aumentar o lucro das transmissões de pay-per-view.

O “outro lado” é representado apenas por declarações sem viço (e quase culpadas) de um gerente do consórcio empresarial. Teria sido melhor se o filme abdicasse completamente de parecer jornalístico e assumisse integralmente sua pauta crítica. Ainda assim, Asbeg e Martins deixam bem clara sua posição e fazem sugestivo retrato póstumo de um estado de espírito que, no Brasil como no mundo, vai virando somente lembrança.

(resenha publicada originalmente durante o É Tudo Verdade 2015)

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