FOLHAS DE VIDRO no teatro
Os cinéfilos conhecem Phillip Ridley de O Reflexo do Mal (The Reflecting Skin) e Paixões na Floresta (The Passion of Darkly Noon). Mas a potência desse romancista, poeta, dramaturgo e artista visual pode ser medida agora também pela peça FOLHAS DE VIDRO, em cartaz somente até 3 de novembro no Teatro Poeira (Rio). É teatro burguês dos bons, nutrido por segredos, dissimulações, manipulações e fantasmagorias no seio de uma família britânica.
Alexandre Varella, que dirigiu a montagem com Michel Blois, divide a cena com Thiago Magalhães em duelos de enorme precisão como dois irmãos em tensa relação de amor e ódio. Um evento traumático da infância – ou uma série deles – lança suas sombras sobre os dois adultos, enquanto ao seu redor a mãe (Carla Ribas) e a mulher de um deles (Cecilia Hoeltz) aparam as fagulhas, cada uma à sua maneira.
O texto é denso e caudaloso. As palavras cortam o ar como facas. As elipses, dentro de uma temporalidade de alguns meses, nos empurram numa montanha-russa de surpresas e revelações desconcertantes. Os personagens estão sempre caindo nos desvãos do casamento, do vício, do ressentimento e do auto-engano, como ratos num labirinto. A infelicidade está a postos em cada esquina. A permanência dos atores no palco, mesmo quando não estão “em cena”, cria uma camada de tensão a mais.
Vale a pena presenciar a tradução e a direção impecáveis, as inflexões minuciosas do elenco e o aproveitamento cuidadoso do cenário econômico e de uma iluminação que é pura linguagem. Acho que ali está um pequeno exemplo de grande teatro.
Teatro Poeira – quinta a sábado às 21h; domingo às 19h – até 3 de novembro.