O outro lado

É Tudo Verdade – Para fazer Vivam os Antípodas!, Victor Kossakovsky dividiu o mundo em quatro quadrantes e foi filmar em oito locais antípodas que tivessem alguma população. Partiu um pouco assim como Cao Guimarães e Pablo Lobato partiram para as cidades mineiras filmadas em Acidente. Buscava um ponto fixo de onde pudesse retirar uma síntese poética do lugar. E daí construiu relações por contraste ou semelhança com os pares do outro lado do planeta.

Depois de curtir a suíte audiovisual resultante, o espectador pode se perguntar a que levou o filme. Talvez não leve mesmo a nenhuma conclusão sobre a vida na Terra, como era o caso da Trilogia katsi de Goddfrey Reggio, mas pelo menos leva a alguns lugares impressionantes. E é bonito como poucos documentários recentes. O virtuosismo  fotográfico de Kossakovsky (ele mesmo faz a câmera e a edição) combina-se com o desenho sonoro muito criativo de Marc Lizier e a música de Alexander Popov para proporcionar um deleite praticamente ininterrupto.

A proposta é mais formalista do que, por exemplo, a do catalão Carlos Casas com sua Trilogia End, rodada em locais extremos do mundo. Kossakovsky tem um interesse apenas superficial pelos elementos humanos que escolhe, como se eles fossem mais um dado da paisagem. Os fragmentos de conversas e ações que percebemos – à exceção talvez dos irmãos argentinos que vivem isolados em Entre Rios – não chegam para caracterizar personagens. O foco do diretor está na ideia geográfico-poética (como bem disse Vitor Souza Lima) de que uma linha invisível uniria os antípodas. Kossakovsky brinca com os eixos – do planeta, da câmera e do nosso olhar – jogando com reflexos (reais e virtuais), imagens de ponta-cabeça, pessoas plantando bananeira etc.

O som também acompanha esse dispositivo de “eliminar” distâncias. Uma música havaiana parece animar um baile em Botswana, um coral russo empolga montanhas e lagos da Patagônia chilena.

Dois momentos me despertaram uma curiosidade especial: o plano de um leão bebendo água visto de dentro do lago (provavelmente filmado com fundo de vidro); e o longo travelling pelos hutongs (bairros populares) de Xangai, talvez a primeira influência que o documentário absorve do Google Street View.

2 comentários sobre “O outro lado

  1. Pingback: Vida de bicho | carmattos

  2. Este longo travelling me parece que foi filmado com steady cam, numa bicicleta ou moto, pela velocidade que estava. Muito bonito o plano!

Deixe um comentário

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s