Eu me Lembro

Amanhã (segunda), às 17h30, no Armazém do Festival do Rio, haverá uma sessão especial do documentário Eu me Lembro, de Luiz Fernando Lobo. Em seguida, eu mediarei um debate com o diretor, o presidente da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, Paulo Abrão, e a historiadora Beatriz Kushnir. A sessão única não está na programação do festival.

O filme se propõe recontar a história dos anos de chumbo a partir dos depoimentos de perseguidos políticos e torturados pela ditadura que receberam o pedido formal de perdão do Estado através da Comissão de Anistia criada em 2001. Antes de ver o filme, às 16h, quem for ao Armazém da Utopia poderá assistir a uma dessas sessões de alta carga simbólica, em que serão julgados os processos de Daniel Souza (filho de Betinho), Luciana Maria Cristina Lyra e Maria Célia de Melo Lundberg.

Eu me Lembro é um misto de revisita ao passado, celebração do presente e alerta para o futuro. As últimas cenas, de repressão policial recente a manifestantes em prol da responsabilização dos torturadores, indicam que nunca é demais defender as liberdades civis. Em depoimentos de variada gama emocional, os ex-ativistas rememoram as violências sofridas na prisão, eventuais reencontros com seus torturadores, e são vistos comovidos por terem seu valor e sua luta reconhecidos publicamente perante a sociedade no âmbito das Caravanas da Anistia. Há entre eles professores, magistrados, camponeses e artistas, alguns objetos de reparação póstuma, como Marighella e Glauber Rocha.

Luiz Fernando Lobo, diretor da Companhia Ensaio Aberto de teatro, fez um documentário hardcore, sem firulas nem experimentações. Talvez devesse usar menos música no fundo de sua própria fala nas vinhetas poéticas com que faz avançar a cronologia. Mas o que está no centro de tudo são as palavras. Há uma quase teatralidade na forma como os relatos dos perseguidos se encontram com o discurso de reparação e homenagem da Justiça, geralmente na voz de Paulo Abrão. Teatralidade não no sentido de coisa falsa ou artificial, mas de uma épica que se realiza em espaço formal e diante do público.

Em dado momento, o sociólogo Solon Annes Viola comenta que deixamos para trás o país do “não me lembro”. O trabalho da Comissão de Anistia tem como função primordial o ato de reconhecer culpas passadas do Estado, mas tem como ação de base o exercício da memória. Lembrar para recobrar a dignidade. Eu me Lembro, o filme, se presta a criar uma memória dessa ação. Lembrar de como nos lembramos.

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