A bateria é onde pulsa a escola de samba. Se ela falha, o corpo inteiro sente. Se ela vibra, tudo o mais vibra também. O novo documentário de Thereza Jessouroun, seu primeiro de longa metragem, vai em busca dos segredos e da história desse órgão vital no corpo da Estação Primeira de Mangueira. Esnobado pela comissão de seleção do Festival do Rio, Coração do Samba estreia hoje (sexta) na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. A primeira exibição será no Unibanco Arteplex, às 19h.
Coração do Samba é filme marcado pelo símbolo da familiaridade. De Thereza com a Mangueira, onde há dez anos fez o belo doc Samba. Da comontadora Marcela Amarante com o ritmo, já que ela própria é integrante da bateria da escola. Familiaridade, enfim, do principal narrador, o carismático, apaixonado e articulado Elmo dos Santos, ex-presidente da Mangueira e filho do fundador da ala da bateria.
Thereza acompanhou os ensaios e desfiles da escola em 2004 (com fotografia de Mauro Pinheiro Jr.) e 2011 (câmera a cargo de Alberto Bellezia). Entre um e outro bloco temporal, alguns fatos mudam o panorama: o diretor de bateria Robson Roque é morto pelo tráfico, a bateria quebra um velho tabu e passa a incorporar mulheres, a rejeição à “paradinha” cai em benefício de uma agora famosa “paradona”. No entanto, a velha luta pelos pontos cruciais na apuração do Sambódromo continua. A bateria da Mangueira é como bicho teimoso que não para de fustigar.
Há no filme um bonito movimento pendular entre passado, presente e futuro. Elmo dos Santos e outros falam das raízes da bateria, de figuras míticas não tão conhecidas como Cartola e Sargento. Contam histórias de abnegação e amor pelos instrumentos. As câmeras vasculham oficinas e ensaios em busca dos detalhes técnicos e das táticas de regência que fazem aquela massa rítmica soar tão homogênea e ao mesmo tempo tão sutilmente diferenciada. Na bateria mirim, flagra as sementes da Mangueira de amanhã.
A informação relevante vem embalada num ritmo quase sempre arrebatador. Assim experimentamos a euforia ao mesmo tempo em que testemunhamos de onde ela vem e como se produz.