Não sei se é verdade, mas Beto Brant tem fama de fugir de entrevistas. No entanto, para marcar a mostra de seus filmes que começa hoje (segunda) no Canal Brasil, ele foi bastante receptivo à ideia de conversar sobre seu trabalho diante da câmera. Exigiu apenas que as gravações fossem feitas “num lugar que tenha a minha cara”. A escolha acabou recaindo no recém-criado bar Pitico, no bairro paulistano de Pinheiros, próximo ao Largo da Batata. No lugar de um antigo estacionamento, o Pitico utiliza cabine e contêineres como elementos arquitetônicos. Bem caberia como cenário de um filme de Beto.
A mostra vai exibir os sete longas do diretor em ordem cronológica, iniciando com Os Matadores, de 1997, e finalizando com Eu Receberia as Piores Notícias de seus Lindos Lábios, lançado em 2012. Trata-se de uma das obras mais sólidas do cinema brasileiro contemporâneo, com um feixe de temas e interesses que vão se abrindo e refinando de filme a filme.
Os três primeiros são thrillers de ação e suspense, marcados por ambientes agressivos e repletos de ícones viris. Os Matadores é um conto de tocaia, traição e morte passado na empoeirada divisa do Brasil com o Paraguai, entre rodeios e assassinos de aluguel. Ação Entre Amigos mostra o projeto de revanche de três ex-guerrilheiros quando descobrem que seu algoz na ditadura está vivo e escondido no interior. O Invasor, seu maior sucesso até agora, fala de um matador que chantageia os dois empresários da construção civil que o contrataram, explorando o medo e a atração do centro pela periferia.
A deterioração das relações humanas, sobretudo da amizade, em razão de culpas, desconfianças e traições é um dos assuntos que sobressaem nessa primeira fase da filmografia de Brant. A violência assume uma feição trágica, tensa, nem um pouco catártica. Os locais de filmagem, sempre razoavelmente identificados, têm um papel fundamental na definição das tramas e dos temperamentos em jogo. Isso é, em parte, responsável pela impressão de coesão que geralmente temos diante dos filmes do diretor.
A partir de Crime Delicado, Beto faz uma inflexão no seu trabalho, aproximando-se mais dos mecanismos do casal, do erotismo e da paixão. Ganha mais espaço um tema que ele próprio faz questão de destacar na sua obra: a busca de uma equalização do poder nos jogos amorosos entre o homem e a mulher. O homem aparece tão ou mais frágil que sua parceira em Crime Delicado e Cão sem Dono, assim como Maria Padilha já virava o jogo em cima de Chico Diaz numa cena de sexo de Os Matadores. A relação amorosa vai pontificar sozinha, enfim, no experimental O Amor Segundo B. Schianberg.
Como uma espécie de corolário dessa trajetória, Eu Receberia… vai conciliar as matrizes da história policial e da paixão arrebatadora num filme que pode ser a síntese do trabalho de Beto Brant e seus principais colaboradores até aqui.
Nesta segunda fase, a arte tem sido ingrediente dramatúrgico relevante nos filmes. O teatro e a pintura em Crime Delicado, a literatura em Cão sem Dono, a videoarte e novamente o teatro em B. Schianberg, a fotografia em Eu Receberia… Em todos esses casos, a ocupação artística dos personagens participa ativamente dos enredos e, até certo ponto, determina a estética utilizada.
Beto Brant se destaca ainda como um dos cineastas mais conectados com a literatura brasileira contemporânea. Não só a de Marçal Aquino, que forneceu os originais para cinco filmes e colaborou na roteirização de outros dois, mas também de Sérgio Sant’anna (Crime Delicado) e Daniel Galera (Cão sem Dono). O conceito de adaptação literária em Brant é abrangente e menos convencional. Em Cão sem Dono, por exemplo, vamos encontrar elementos de um conto de outro livro de Galera. Por sua vez, B. Schianberg teve origem num personagem do livro Eu Receberia…, de Aquino, que seria levado à tela mais adiante.
Além de Marçal Aquino, o parceiro mais frequente de Beto Brant tem sido Renato Ciasca (no centro da foto), com quem ele divide créditos desde 1987. Produtor na maioria das vezes, corroteirista em algumas, Ciasca reparte (“soma”, ele corrige) a assinatura de direção em Cão sem Dono e Eu Receberia… Na mostra do Canal Brasil, as entrevistas sobre esses filmes contam com a presença dos dois diretores. Outra parceria está rolando agora entre Brant, Ciasca e Camila Pitanga. Renato produz e Beto e Camila dirigem juntos um documentários sobre Antonio Pitanga, pai da atriz. O filme, em fase de montagem, é o primeiro documentário de longa metragem com que Beto e Renato se envolvem.
Logo mais, à 0h15 de terça, vai ao ar a minha primeira conversa com Beto, antes da exibição de Os Matadores. A direção e edição das entrevistas foi de Kiko Mollica. Cada uma tem cerca de 10 minutos de duração. O programa terá uma reprise na madrugada de sexta para sábado, às 2h05. A mostra prossegue nas segundas-feiras seguintes, nos mesmos horários. Veja a programação aqui.
Cheguei atrasada em casa…só peguei o filme. Ainda gosto bastante, acho que vou gostar sempre. E o casamento do Beto Bcom Maçal deu bons rebentos. Mas e a entrevista, quando repetem?
Bj, Carlinhos
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A única reprise prevista é inviável: na madrugada de sexta para sábado, às 2h05
Beto Brant e Claudio Assis são os dois maiores diretores(em atividade) cinema nacional!!! Fico contente de ler noticias sobre eles! 🙂