VIVER LÁ
O título completo de VIVER LÁ é tão longo quanto grande parte das suas tomadas: “Vivir allí no es el infierno, es el fuego del desierto. La plenitud de la vida, que quedó ahí como un árbol“. Numa localidade erma do Deserto de Atacama, um velho camponês lida com suas cabras, galinhas, cachorro e cavalo. A câmera se mantém quase sempre muito afastada, numa postura de observação distante e experimental. Quase não se ouve palavra, exceto por monólogos do homem com os animais, uma rápida conversa e um misterioso off feminino.
Nessa coprodução chileno-brasileira, Javiera Veliz Fajardo propõe uma meditação muda sobre suas raízes atacamenhas. Sua câmera se detém não só sobre o camponês, mas também sobre as colinas nuas de Totoral, árvores, flores e um rio que – menciona-se – vez por outra provoca aluviões e destrói os olivais. A montagem organiza os longos planos gerais ora por cortes secos que lembram um poema de João Cabral de Melo Neto, ora por lentíssimas fusões que remetem à quase imperceptível passagem do tempo naquele lugar adormecido.
Essa poética do não acontecimento quer nos ensinar a não esperar nada além do que está dado no quadro. Ao contrário do calabrês As Quatro Voltas, com o qual a princípio se parece, não há um ciclo vital a ser acompanhado, nem surpresas no interior das cenas. O efeito pode ser imersivo pela beleza dos enquadramentos e a sedução do silêncio. Mas pode ser também decepcionante para quem não consegue lutar contra as expectativas.