Festival do Rio
Promessa de personagem
Suspeito que haja uma história de amor não contada em A Garota do Sul. O documentarista argentino José Luis García tomou para si uma tarefa ambiciosa. Mais de 20 anos depois de ter visitado a Coreia do Norte numa excursão da esquerda juvenil, ele decidiu voltar a Pyongyang para reencontrar uma mulher que o havia impressionado vivamente. Em 1989, a então jovem Lim Su-Kyung atravessara a vigiadíssima fronteira entre as duas Coreias para pregar a reunificação do país. Vinda da Coreia do Sul, ela era a grande atração do Festival da Juventude Comunista em que José Luis também tomava parte.
O reencontro com uma professora que quase não lembra mais a moça voluntariosa de antes tinha tudo para ser uma poderosa metonímia dos rumos tomados pelas duas Coreias: um distanciamento cada vez maior e o fim de uma era de idealismo. Mas José Luis não consegue sustentar o arco de sua proposta. O melhor de A Garota do Sul são as cenas de 1989, ainda em VHS, que ocupam o terço inicial do filme. A leitura que o diretor faz delas, não sem alguma ironia, é divertida e tocante. Quando Lim Su-Kyung reaparece e chega a viajar a Buenos Aires, o documentário gradualmente perde fôlego, ritmo e interesse. Os impasses entre ela, o diretor e seu intérprete geram esvaziamento e não são aproveitados dramaticamente na narrativa.
Um possível interesse romântico parece bastante recalcado, talvez no filme como na vida. Mais que tudo, José Luis não logra engendrar uma reflexão minimamente sólida sobre o tempo político transcorrido. A garota do sul fica como uma promessa de personagem que não se cumpre.