A escolha de Hollywood em fins dos anos 1960 forneceu a Quentin Tarantino uma conjuntura propícia a explorar várias de suas fixações em ERA UMA VEZ EM… HOLLYWOOD. Penso em quatro delas:
– Mania de referências
Cada sequência do filme é pretexto para uma enxurrada de citações visuais, verbais e musicais. Eu gostaria de saber que percentual do orçamento foi destinado à construção de fachadas de cinemas, outdoors, letreiros de neon, rótulos de produtos de época, licenciamento de músicas e pesquisa de marcas, designs, etc. Talvez mais do que em qualquer outro filme, Tarantino convoca o espectador a situar-se num determinado período ao mesmo tempo em que acompanha os três eixos narrativos (Rick, Cliff e Sharon). As referências não são um discurso paralelo, mas parte integrante da ação. Pode-se dizer que ERA UMA VEZ EM HOLLYWOOD é um filme-citação que mescla realidade e invenção.
– Conversas imponderáveis
Uma das marcas autorais de Tarantino são os diálogos em montanha-russa, de evolução imprevisível, que podem não ter substância nenhuma (e quase nunca têm), mas destilam o prazer da fala inesperada e um humor bizarro. Nesse novo filme, a conversalhada por vezes se estende no vazio e se torna maçante, pecado imperdoável em Tarantino. Mas há também os momentos de brilho, como as interações entre Rick Dalton e a atriz mirim Trudi Fraser (personagem real) ou a longa cena do filme-dentro-do-filme em que Rick se esquece de suas falas. Nesses momentos, as conversas se beneficiam ainda mais com o talento extraordinário de Leonardo diCaprio. O apetite com que os atores se lançam nos seus papéis é o ímã principal do filme, mesmo quando ele parece tolo e pueril além da conta.
– Mulheres extremas
Num cinema essencialmente masculino como o de Tarantino, as mulheres ocupam sempre posições extremas, seja como a vingadora ultraviolenta The Bride de Kill Bill, seja como a drogadíssima e vulnerável Mia de Pulp Fiction. Em ERA UMA VEZ EM… HOLLYWOOD, temos dois exemplos dessa dicotomia. Sharon Tate é retratada como uma mocinha ingênua e quase parva, deslumbrada com a perspectiva do estrelato. É tão angelical que Tarantino resolve reescrever a história, “salvando-a” dos assassinos e desviando-os para a casa de Rick Dalton. No polo oposto estão as porraloucas da “família” Mason, aquarteladas no Rancho Spahn. Uma delas, Susan Atkins, seria a responsável direta pelo esfaqueamento de Sharon. No filme, porém, Tarantino vinga-se da personagem fazendo-a berrar enlouquecida enquanto é estraçalhada por um cachorro e em seguida torrada por um lança-chamas. Para quem acusa o cineasta de misoginia, há mais um detalhe pitoresco: no filme, as mulheres roncam ao dormir.
– Podofilia
Não me lembro se Tarantino já havia dado tanta pinta de podofilia como nesse filme. As cenas de pés em primeiro plano se multiplicam, seja em caminhadas, seja em desembarque de carros ou em mulheres repousando os pés (alguns sujos, para ficar ainda mais fetichista) na frente das lentes.
Quanto a pedofilia, podemos citar Pulo Fiction e Kilo Bill, ambos com closes nos pés de Uma Thurman. O último em especial tem uma cena longa na qual a Noiva tenta recuperar o movimento dos pés depois de anos em coma.
Você quis dizer podofilia, né? Muito boas suas lembranças.
Podofilia…. pedofilia é outra coisa….
A podofilia do Tarantino foi muito bem sacada. Esse detalhe e mais o do ronco das mulheres mostram como o Carmattos é um crítico atento.
Atento ou fetichista também? kkkkkkk