The Cove

Mar vermelho

Há um modelo de documentário que domina as preferências da crítica e do público bem-pensante americano. Envolve geralmente uma causa, de preferência ecológica, uma abordagem emocional e toques de dramaturgia ligados ao cinema de ficção. The Cove tem tudo isso e ganhou o Oscar de documentário deste ano. A matança de golfinhos na enseada de Taiji, Japão, é de fato um espetáculo chocante, merecedor de toda indignação. Para mostrá-lo, Louie Psihoyos e sua equipe se convertem numa troupe de filme de espionagem (comparam-se textualmente a Ocean Eleven) e se dispõem a enfrentar ou driblar a máfia pesqueira japonesa com câmeras ocultas e todo um aparato hitech.

A ênfase nesse circo tecnológico, porém, não se justifica perante os resultados alcançados na filmagem. Tudo soa mais como uma aventura de americanos bem-intencionados e bem equipados contra vilões de sotaque estrangeiro. Uma grosseira escalação de personagens evoca velhos sentimentos antinipônicos e situa como fracos e indolentes os países pobres que se deixariam corromper pelos interesses japoneses na normatização internacional da caça às baleias.

No centro de tudo, o foco emocional é reiterado a cada 15 minutos de filme: a amizade entre humanos e os inteligentes, sorridentes golfinhos; e a culpa de Rick O’Barry, criador do sucesso de Flipper, que agora se dedica à expiação combatendo a captura dos peixes. Esse argumento não renderia mais que um bom programa de TV, não fosse a verdade inconveniente daquele mar vermelho que capturou consciências e estatuetas. Não estamos diante de um novo O Equilibrista.     

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