O filme de hoje (0h15 de quarta) na mostra de filmes africanos do Canal Brasil é uma produção do Máli, o sétimo maior país em tamanho e um dos que têm a cultura mais rica do continente. É de lá que vem a tradição dos griôs, os guardiões da memória, que têm a função de transmitir a história do país.
O documentário Dolce Vita Africana trata da memória fotográfica do Máli. Não do país inteiro, mas de uma parcela privilegiada da população, aquela que frequentava o estúdio do fotógrafo Malick Sidibê e formava seu grupo de amigos.
Malick Sidibé é um antípoda de Sebastião Salgado. Virou celebridade mundial – prêmio Hasselblad e Bienal de Veneza – sem nunca apontar as lentes para um africano miserável. “Fotografia, para mim, é juventude e alegria”, diz ele para a câmera de Cosima Spender nesse doc realizado para as TVs BBC e ZDF. Sidibé fez sua fama nos anos 1960 e 70, quando Bamako, a capital do Mali, vivia sua dolce vita, embalada por música cubana, congolesa e americana. Era a época dos clubes de baile, de jovens seminus nas praias e de uma atitude voltada para a modernidade.
Hoje o fotógrafo está mais caseiro, cercado por suas quatro esposas e 15 filhos. Dolce Vita Africana reúne esses velhos amigos para rememorar os bons tempos e reviver um baile com os rigores de então. Rigor à maneira africana, é claro, com muita cor e descontração.
Sidibé e seus amigos (não há lugar para mulheres protagonistas nessa sociedade muçulmana) fornecem um ponto de vista curioso da história recente do Mali, centrado nos costumes e no pragmatismo. Levam também a câmera a um gostoso passeio por Bamako. Por vezes, Cosima planta o tripé em frente ao estúdio de Sidibé e assiste à dolce vita de hoje passar pela calçada. É fascinante.
Em filmes como Eu, um Negro e Jaguar, Jean Rouch soube como absorver e problematizar essa maneira de se divertir e se relacionar ludicamente com as culturas estrangeiras. Ainda que de maneira superficial, Dolce Vita Africana traz de volta aquele sentimento.