THE SQUARE: A ARTE DA DISCÓRDIA, vencedor da Palma de Ouro de Cannes e do European Film Award, é como uma dessas exposições de arte contemporânea que enchem várias salas de apetrechos e ruídos estranhos, dispostos em ordem meio labiríntica, de modo que a gente percorre os espaços com muita excitação, mas ao final não sabe bem o que viu. Em princípio, é uma sátira da arte contemporânea, especialmente dessa arte centrada no comportamento humano, nas atitudes sociais e nas mensagens politicamente corretas. O fictício museu sueco, inspirado no Palácio Real de Estocolmo, prepara a instalação “O Quadrado”, que pretende motivar as pessoas à generosidade e ao cuidado humanitário.
Mas Ruben Östlund, diretor do ótimo “Força Maior” e também ele um autor de instalações, quer falar de muitas outras coisas. Por exemplo, de indiferença com o outro e de excessos de tolerância, como na cena da palestra interrompida por um doente mental. Quer falar dos limites da performance numa sequência extraordinária em que o ator Terry Notary atua como um macaco num jantar de gala. Por extensão, fala da passividade dos esclarecidos diante de qualquer mistificação vendida como arte. THE SQUARE tematiza ainda a facilidade com que podemos nos transformar em animais e, por fim, a busca pelo impacto midiático em tempos de Youtube e mídias sociais. Eu disse, é muita coisa…
Tudo isso circula em torno de Christian, o elegante e bem pensante curador do museu. Seu nome não podia ser mais apropriado para um personagem martirizado seguidamente por diversas experiências mal-sucedidas: um roubo, uma reação desastrada, uma trepada de consequência problemática, um vídeo promocional nefasto que viraliza à sua revelia e um menino disposto a transformar sua vida num inferno. Christian é o tipo do cara que se julga limpo e correto o suficiente para se safar de qualquer sujeira ou incorreção.
O filme transita entre os diversos plots sem uma estrutura bem definida, deixando blocos inconclusos e ações sem explicação ou verossimilhança. Carrega como salvo-condutos o absurdo e a hipérbole, estabelecidos desde o início, quando uma estátua equestre é derrubada para dar lugar ao “Quadrado” diante da fachada do museu. Se abrirmos mão de exigências mais realistas e de continuidade narrativa, THE SQUARE tem muito a oferecer. Mesmo que, ao final, o saldo pareça mais pretensioso que sólido, a caminhada por aquele labirinto é imensamente prazerosa. A direção palpitante, as atuações repletas de minúcias e a sensação de permanente imprevisibilidade nos agarram pelo colarinho.
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Assisti na semana passada ao longa Play, não conhecia Östlund, grande filme! Tratarei de assistir ao “The Square”. Obrigado pela crítica.
Não conheço “Play”. Vou procurar. Grato pela dica.