Esses meninos da Malásia

Começa amanhã (terça), na Caixa Cultural, Rio, a Mostra Faça Você Mesmo – O Novo Cinema da Malásia (visite o site). Minha amiga Patricia Rebello vai mediar uma mesa de debate com os diretores Amir Muhammad, Woo Ming Ji,  Anna Azevedo e Luis Carlos Nascimento, no dia 21, às 17 horas. Muito gentilmente, ela escreveu esse post para o blog:   

Cena de "Sepet"

Em janeiro, a revista Cahiers du Cinéma soltou uma edição especial com os melhores filmes dos anos 2000. E, como sempre acontece nessas circunstâncias, não podia faltar uma lista dos “top ten” da década – os 10 filmes mais votados pelo time da redação daquela que, ainda que já tenha conhecido dias de maior prestígio, continua tendo um papel fundamental na crítica de cinema contemporânea. Em meio a eleitos conhecidos por estas bandas, como David Lynch, Cronenberg e Kiarostami, surgem três nomes não tão conhecidos, ou fáceis de pronunciar, por aqui: Apichatpong Weerasethakul (Tropical Malady, 2004), Bong Joon-ho (The Host, 2006) e Wang Bing (A Oeste dos Trilhos, 2002). Por mais que a cultura cinematográfica no Brasil venha conhecendo um saudável crescimento, a não ser que você seja frequentador de circuitos de arte, festivais ou mostras, dificilmente encontrou com estes filmes e autores nas salas do grande circuito.

Nessa mesma edição, o cinema asiático é saudado como um dos que mais desfrutaram visibilidade nos anos 2000, através de políticas de financiamento culturais, de festivais, de distribuição e de exibição. Em certo trecho, a publicação francesa destaca, além destes fatores, a importância trazida pelo aporte da tecnologia digital na região, transformando a maneira de se fazer cinema, driblando a censura e fugindo das receitas fáceis e das fórmulas carcomidas. O melhor exemplo disso, está lá escrito, é o cinema da Malásia e seus jovens realizadores em digital.

Boa parte dessa nova geração, que vem revitalizando o cinema malaio com trabalhos dialeticamente fortes e delicados, simples e complexos, leves e intensos, estará à disposição do publico na mostra Faça Você Mesmo – O Novo Cinema da Malásia, que acontece na Caixa Cultural, no Rio, entre os dias 16 e 28 de março. É uma oportunidade imperdível de conhecer um cinema feito por gente muito jovem, com muita disposição para colocar em jogo sua cultura e seus problemas, suas  tradições e suas formas de encarar, e encantar, a vida. São ficções e documentários que nos tornam tão próximos da Malásia quanto de uma forma quase artesanal de fazer cinema.

A Malásia é povoada por três grandes povos asiáticos (malaios, indianos e chineses); é um verdadeiro caldeirão de influências coloniais, de tradições árabes e européias, fervilhando de questões pouco conhecidas, ou mesmo discutidas, por aqui. Diferenças entre raças e entre religiões (muçulmanos, budistas e hindus vivem lado a lado), diferenças de comportamento e de atitude; choques, opressão, sexualidade, infância, crenças. Está tudo nestes filmes, em deliciosas narrativas, em personagens cativantes, que encantam e surpreendem pela forma como são bem sucedidos ao entrar em contato conosco, povo ocidental meio ressabiado e de pé atrás.

Os meninos da Malásia sabem fazer cinema “do bom” porque, além de uma vontade de falar sobre seu país e suas peculiaridades, eles amam o bom cinema. Isso está escrito em cada linha dos roteiros (repletos de citações, como a protagonista de Sepet, que adora os filmes de Wong Kar Wai e Jonhy To), na bonita fotografia com as cores e a liberdade das ruas (como na paisagem das aventuras dos dois meninos de Flores no Bolso), ou na poesia da montagem por atração (nas bonitas sequências de O Elefante e o Mar). Afora os ótimos títulos, os meninos da Malásia trazem para o Brasil bom humor, espontaneidade e uma grande alegria de viver, coisa cada vez mais rara de encontrar. E exatamente porque descobriram uma fórmula delicada para falar das densas questões que atravessam seus filmes, torna-se mais leve respirar durante as histórias. E com certeza, se sai de cada sessão com um sentimento renovado de generosidade pelo mundo, pelas pessoas e pelas coisas simples e belas da vida.

Patricia Rebello

P.S. No dia 25, a mostra começa também na Caixa Cultural de São Paulo

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