Desfeitos os sonhos da globalização como panaceia para as desigualdades e rivalidades do mundo, nosso conturbado planeta assumiu-se como um mapa de deslocamentos forçados. O documentário EXODUS – DE ONDE EU VIM NÃO EXISTE MAIS examina alguns desses pontos onde refugiados tentam encontrar uma nova terra ou retornar à sua de origem.
Coprodução Brasil-Alemanha, é a estreia na direção do alemão Hank Levine, também ele um imigrante que chegou ao Brasil em 2000. Depois de juntar-se à O2, coproduziu Cidade de Deus e produziu Lixo Extraordinário e Praia do Futuro.
EXODUS tem estrutura multiplot e compila casos em sete países ao longo de dois anos. Em São Paulo, dois jovens sírios usam o Brasil como escala para um destino final na Europa ou na América do Norte. Na Alemanha, dois ativistas do Togo e do Sudão do Sul se empenham na causa dos imigrantes e refugiados. Em Mianmar, uma família de minoria kachin (cristãos) se arrisca a visitar sua casa interditada por conta da guerra civil que há quase 70 anos rasga o país. Na fronteira da Argélia com o Marrocos, uma senhora saarauí jura por Alá nunca se render aos marroquinos que ocupam ilegalmente o Saara Ocidental há 40 anos.
Felizmente, Levine não se limita a colher cabeças falantes, mas procura captar ações que definam cada um de seus personagens. A visita a um antigo campo de refugiados na Alemanha revela uma relativa semelhança com campos de concentração. A chegada de um sírio-palestino ao Brasil, sua viagem a Cuba e a partida para a Alemanha ilustram um percurso comum a muitos refugiados. A relação de uma sudanesa com seu noivo alemão põe em cheque o afeto diante das diferenças e queixas recíprocas. O treinamento de tiro ao alvo em São Paulo reconecta uma moça síria com o cheiro de pólvora que caracterizava a Damasco de sua memória. São cenas que dizem muito, e sinteticamente, sobre a confusão de sentimentos envolvida na situação de desterro.
Curtas intervenções de texto da escritora afrobritânica Tayie Selasi, narrado por Wagner Moura, não acrescentam grande coisa à estrutura modular do filme. O que conta de verdade é a força das palavras captadas diretamente e a potência das imagens. São impressionantes, por exemplo, os passeios da câmera por um campo de refugiados em Mianmar, o enfrentamento simbólico dos soldados marroquinos por senhoras saarauís, ou ainda o protesto no deserto com a formação humana da expressão “Sahara Libre”.
EXODUS tem a dignidade de colocar uma produção pujante e caprichada inteiramente a serviço de uma causa. Enfatizar o poder de afirmação daquelas pessoas em vez de apelar para o sentimentalismo paternalista é outra virtude que salta aos olhos.