O ANO DE 1985
Ainda existem novidades sobre o advento da Aids para se contar no cinema? 120 Batimentos por Minuto mostrou que sim, com sua abordagem trágico-épica dos militantes do Act Up de Paris (leia aqui sobre esse filme extraordinário, disponível em plataformas de streaming). Em tom muito menor, O ANO DE 1985 aborda novamente o tema, mas sem pretensões de trazer ângulos novos. É mais uma história comovente sobre o drama de um rapaz gay saindo do armário perante a família em meados da década de 80.
O travadíssimo Adrian (Cory Michael Smith), instalado em Nova York desde que não suportou a pressão dos pais conservadores no Texas, retorna para o Natal de 1985 trazendo presentes caros e uma angústia sem fim. Para ele, a visita é uma silenciosa despedida na iminência de uma piora fatal no seu estado de saúde. Para os pais religiosos e ultraconservadores, é como se recebessem um quase estranho em sua casa. Para o irmão menor, é uma fresta que se abre para o mundo da tolerância. Para a moça com quem Adrian flertava desde a infância, é um enigma a desvendar.
Com as dramáticas relações entre esses poucos personagens mantidas sob admirável controle, o diretor malaio Yen Tan nos faz aceitar bem um roteiro que parece defasado em pelo menos 20 anos. Fosse menos preciso na observação de comportamentos e reações ou menos discreto no trabalho de direção, e dificilmente engoliríamos lugares-comuns como o pai veterano do Vietnã e homofóbico empedernido, a mãe afetuosa e compreensiva (que até votou contra Reagan escondido do marido), o ex-colega que fazia bullying e os ecos do universo gay reduzidos à imagem de caras dançando ou se beijando.
O fato é que, mesmo numa narrativa padrão e lacrimosa, “1985” resulta tocante e ao mesmo tempo sóbrio. A evocativa fotografia em preto e branco, a câmera sensível para sugerir espaços de afeto dentro de um quadro de repressão e constrangimento, além de atuações ricas em sutilezas, compensam a ausência de uma maior singularidade.