Sobre a comédia romântica JOHN FROM e o documentário VOLTA À TERRA
Uma incomensurável distância separa o bairro lisboeta das Telheiras, com seus caixotes residenciais homogêneos, e o frescor tropical das ilhas da Melanésia, no Pacífico. Mas para a imaginação romântica de uma adolescente, esses dois lados do mundo podem perfeitamente se confundir. É o que acontece com Rita (Júlia Palha) em JOHN FROM (em cartaz no Joia em sessão diária às 14:10). Rita leva uma vida tediosa entre a varandinha de seu apartamento, um pequeno centro cultural onde tenta tocar piano e as conversinhas fiadas com sua melhor amiga. O destino faz com que ela de repente se encante com uma exposição de fotos da Melanésia e com o próprio fotógrafo, um homem mais velho que se mudou para o seu prédio.
O diretor João Nicolau e sua parceira de roteiro, Mariana Ricardo, desenham com calma esse mundinho de esquinas vazias, pátios anônimos e vidas sem viço. O filme evoca ora o humor surrealista de Miguel Gomes, ora a comicidade lacônica de Aki Kaurismäki (devidamente citado), ora ainda os desarranjos relacionais de Hong Sang-soo. A partir de certo ponto, a fantasia de Rita começa a invadir e tomar conta do filme inteiro, assim como o misterioso nevoeiro que se propaga pelas ruas e prédios da área.
A ideia de uma obsessão sexual é apenas tangenciada, prevalecendo o escapismo platônico e uma certa ingenuidade a reduzir um alcance maior que o filme poderia ter. Isso não impede que João Nicolau, neste seu segundo longa, deixe marca própria numa tradição de crônicas de bairro muito típica do cinema português.
Assim como seu título, VOLTA À TERRA é de uma simplicidade absoluta. Uma câmera sempre muito bem posicionada observa o cotidiano de uma pequeníssima aldeia do norte de Portugal, na fronteira do Minho com Trás-os-Montes. Pequena até no nome, Uz tem somente 49 moradores. Muitos emigraram, mas o filme não se detém nesse tipo de informação. Contenta-se com o registro do trabalho rural e da expressão oral dos camponeses, sempre no limite entre o diálogo e o solilóquio. Eles trabalham a terra, plantam e colhem batatas, conduzem o gado, tosquiam as ovelhas, malham o centeio, fazem procissão e ensaiam canções para as festas daquele querido mês de agosto.
O velho Antonio e o jovem Daniel (presença muito simpática na tela) despontam como protagonistas, com presença ligeiramente mais destacada que os demais. Mas, afinal, nada de relevante se produz nem se revela além do jeito de ser daquela gente e suas converas miúdas. O documentário parece ser um projeto afetivo de João Pedro Plácido, diretor de fotografia que decidiu, aqui, retornar à aldeia de seus pais e de sua infância. A singeleza de suas intenções pode arrancar um riso amável vez ou outra – e isso é tudo o que ele tem a oferecer junto com as bonitas imagens do campo.