É inevitável que O BOTÃO DE PÉROLA (El Botón de Nácar) alimente altas expectativas em quem viu Nostalgia da Luz. Patricio Guzmán passa do deserto às águas em sua pretendida trilogia sobre o destino dos chilenos. O formato do filme-ensaio, narrado pela voz cálida e compassada do diretor, lhe permite lidar com materiais diversos – entrevistas, arquivos, reconstituições, imagens computadorizadas – e transitar com bastante liberdade entre temas distantes, mas conectados por paralelos históricos e similitudes poéticas.
Nesse caso, dois misteriosos botões encontrados no oceano levantam uma série de evocações e especulações a respeito do extermínio dos povos indígenas (no que o filme se aproxima bastante do 500 Almas de Joel Pizzini) e do assassinato de ativistas de esquerda durante a ditadura Pinochet, cujos corpos eram atirados no mar. Guzmán adiciona informações científicas, ressonâncias míticas e lembranças pessoais a seu discurso, tendo sempre a água como mediadora entre épocas e espaços longínquos. O Chile, com seus 4.300 km de litoral, não conseguiu manter intimidade com o mar.
Encontramos aqui o mesmo sentido de maravilhoso das imagens como no filme anterior, mas nem tudo se repete com a mesma eficácia. Algumas conexões soam frágeis demais, quase forçadas, como a dos botões do título. E o estilo solene que nos encantou em Nostalgia da Luz agora pode soar um tanto reiterativo e exaurido. Ainda assim, que se diga, é um filme belíssimo. E que, a par de ecos históricos e míticos, prossegue a incansável interrogação de Guzmán sobre o fado do Chile depois da queda de Allende.
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