Uma artista trans indígena

UÝRA – A RETOMADA DA FLORESTA

Não sei bem que pronome usar ao me referir a Uýra Sodoma, que também se chama Emerson Pontes. Opto, enfim, pelo feminino, que está no título do documentário. A artista Uýra se apresenta como trans indígena não binária. Neta de indígenas, nasceu e vive em Manaus. Premiada, já participou da Bienal de São Paulo e de exposições em vários países. Formou-se em Biologia e tem mestrado em Ecologia. O filme de Juliana Curi mostra seu trabalho na Amazônia, conscientizando jovens ribeirinhos e fazendo oficinas de maquiagem telúrica com drag queens de ascendência indígena, as Tupiniqueens.

Eis uma cena impensável, digamos, 30 anos atrás. Uýra ilustra bem o resultado de um movimento recente de liberação individual, politização dos corpos e compreensão do valor da ancestralidade. A artista engaja sua dança e sua criatividade na defesa da floresta e da identidade do seu povo, que ela própria descobriu tardiamente. As maquiagens, adereços e figurinos com que se “monta” para suas performances incorporam folhagens, palhas, cascas de árvore e toda uma riqueza vinda da mata. Vestida como uma grande lagarta, por exemplo, ela denuncia a degradação ambiental de Manaus. Na pele de uma árvore, ensina que a periferia é uma floresta também. Uma floresta humana que precisa se proteger mutuamente como fazem os elementos da floresta verde.

Inteligente e bem falante, Uýra/Emerson é uma figura fascinante, que certamente faz diferença por onde passa com sua arte e suas palavras. É muito bom conhecê-la, apesar do filme fragmentado e incompleto que a apresenta. Na verdade, este é um média-metragem artificialmente alongado por créditos finais intermináveis. Mas vale a pena esperar os primeiros letreiros para ver algumas danças de Uýra em suas belíssimas encarnações florestais ao som da música envolvente de Nascuy Linaes.

>> Uýra – A Retomada da Floresta está nos cinemas.

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