Para onde foi Borowczyk?

LOVE EXPRESS – O DESAPARECIMENTO DE WALERIAN BOROWCZYK no streaming

Quando jovem nos anos 1970, eu não tinha audácia suficiente para ver filmes pornô nos cines Rex, Íris ou Orly, no Rio de Janeiro. Contentava-me então com os filmes eróticos menos explícitos – e mais “artísticos” – de Walerian Borowczyk. Muitas vezes me escapavam o sentido surreal-fetichista das obras e as conexões que o diretor estabelecia entre sexo e ditadura (Goto, a Ilha do Amor), sexo e nobreza medieval (Blanche), sexo e terror (O Monstro/La Bête), sexo e mais sexo (Contos Imorais). Mas tudo aquilo me parecia bonito, transgressor e, sobretudo, excitante.

Nem antes disso, nem desde então, ouvi mais falar de Borowczyk até aparecer o documentário Love Express – o Desaparecimento de Walerian Borowczyk (Love Express. Zaginiecie Waleriana Borowczyka). Falecido em 2006, o cineasta polonês radicado na França aparece em antigas entrevistas e alguns making-ofs. Quem faz o serviço pesado de narrar o filme é o diretor de fotografia Noël Véry, que trabalhou em dez de seus filmes sem nunca deixar de considerá-lo “totalmente maluco”.

No documentário do também polonês Kuba Mikurda, a trajetória de Borowczyk é recontada em pinceladas rápidas, a partir de suas excêntricas animações dos anos 1950 e 1960, antes que ele se mudasse para a França em busca de liberdade de criação. Já nessas animações com objetos se insinuava o teor de fetichismo que marcaria sua obra posterior, assinalando o erotismo que permeia o mundo.

O perfil segue em frente, pontuando seus maiores sucessos – como os citados no primeiro parágrafo – e o progressivo aprisionamento de Borowczyk na gaiola de cineasta erótico-pornográfico. “Eu só mostro o que todos sonham ver”, dizia ele.

O fim melancólico com Emmanuelle 5 e coisas do gênero fechou uma carreira feita mais de curtas que de longas, mais de depreciação que de elogios. Ainda assim, o documentário procura resgatar o talento e a personalidade singular de Borowczyk através de depoimentos de gente como o colega de escola de cinema Andrzej Wajda; os admiradores Neil Jordan, Terry Gilliam e Patrice Leconte; e críticos como Slavoj Žižek, Marc Cousins e Peter Bradshaw. Em contrapartida, a atriz Lisbeth Hummel, personagem central de O Monstro, confessa o mal estar que sentiu durante as filmagens e admite que o trabalho com Borowczyk fez muito mal a sua carreira.  

Kuba Mikurda contou com uma equipe de montagem e grafismos espertíssima, capaz de dinamizar o modelo das cabeças falantes e torná-lo divertido e atraente. Basta ver como a edição potencializa os tiques maníacos de Žižek.

O documentário poderia ser um pouco maior e mostrar mais cenas dos filmes para ilustrar o estilo e as obsessões do cineasta. Ouvimos muito mais do que vemos, com o detalhe de eliminarem todas as tomadas climáticas dos trechos exibidos. O lugar ideal desse filme seria como introdução e aperitivo a uma mostra do realizador.

O mundo de Borowczyk ficou para trás, assim como os do fotógrafo David Hamilton, da revista Playboy e de tantos outros templos do soft porn. Ficou para trás também o cunho machista do universo do cineasta, que não deixa de ser mencionado com as devidas remissões a sua época. Love Express é a crônica de um desaparecimento.

>> Love Express: O Desaparecimento de Walerian Borowczyk está na plataforma Reserva Imovision

Trailer legendado em inglês:

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