Simone, Maggie, Marilyn!

simoneAinda restam dois fins de semana para ver a nova montagem de Depois da Queda, de Arthur Miller, em cartaz no Teatro Glaucio Gill. Vale a pena suportar as cadeiras desconfortáveis da salinha durante três horas. O que se vê no palco compensa e muito.

Miller escreveu After the Fall pouco tempo depois da morte de Marilyn Monroe, com quem foi casado, e de ter deposto no Comitê de Atividades Antiamericanas sob suspeita de ser comunista. Ambos os eventos são evocados na peça através de personagens alteregos. O próprio Miller assume a persona do advogado Quentin, enquanto Marilyn aparece como a cantora Maggie e Elia Kazan, como o delator Myke. Curiosamente, foi Kazan quem colaborou no texto da peça e dirigiu sua primeira montagem em Nova York, em 1964.

Não é um texto fácil. As falas são quase ininterruptas, com alguns poucos respiros musicais. Quase tudo são projeções mentais de Quentin, o que possibilita uma estrutura típica do inconsciente, feita de idas e vindas, cortes bruscos e interrupções aleatórias. Essa montanha-russa, muito marcada por influências do discurso psicanalítico, é também o que segura a atenção e o interesse do espectador.

A montagem dirigida por Felipe Vidal não parece inventar muito em cima da invenção de Miller. Trabalha na eficiência das marcações e na tipificação clara dos personagens. Lucas Gouvea (Quentin), Thaís Tedesco (Holga e a mãe), Leandro Daniel Colombo (Lou) e Simone Spoladore (Maggie) têm os papéis mais exigentes. E aqui cabe um parágrafo especial sobre a performance de Simone.

É absolutamente consagradora para essa atriz excepcional. Quando ela entra em cena, já perto do final do primeiro ato, é como se o iluminador dobrasse as luzes sobre o palco. Ela vem com o mix de sensualidade, beleza, vulnerabilidade e franqueza que imaginamos em Marilyn. Seus meneios de corpo e de voz recriam um arquétipo de feminilidade que parece não existir mais hoje em dia. No intervalo, Dinah Cesare, a dramaturga e crítica de teatro que se sentava ao meu lado, comentou: “Eu não sabia que uma mulher podia ser assim totalmente encantadora”. Ponto para a Maggie de Simone. O segundo ato é inteiramente dominado por ela. Em dado momento, equilibrando um copo de whisky na mão e a si mesma sobre os saltos altos, ela pronuncia sua profissão de fé: “Detesto o gosto, mas adoro o efeito”. Aí já não era mais Simone nem Maggie –era Marilyn!

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