O menino e o silêncio

TAKARA, A NOITE EM QUE NADEI

Um pouco de Ozu + outro tanto de Kore-eda + uma pitada de José Luis Guerín = TAKARA, A NOITE EM QUE NADEI. Não conheço a obra do francês Damien Manivel, mas li no Libération que é povoada por personagens mergulhados em locais específicos, em estado de disponibilidade para serem atravessados pelo ambiente e a meteorologia. Em TAKARA, dirigido a quatro mãos com Kohei Igarashi, ouvimos As Quatro Estações de Vivaldi, mas tudo se passa num único dia de inverno pesado, nas montanhas nevadas do norte do Japão.

Um menino de seis anos (Takara Kogawa) não consegue conciliar o sono após a saída do pai para o trabalho no mercado de peixe. A caminho da escola, desvia-se para levar um desenho até o pai. Sonolento, vagueia pela neve e toma diversos rumos pelo campo e cidade. Não há muito mais do que isso na proposta minimalista de Damien e Kohei. Há mesmo uma certa complacência com o vazio, um gosto exacerbado pela deambulação por si mesma.

O filme, contudo, não é desprovido de uma certa graça. A relação do garoto com a paisagem às vezes inóspita suscita belos enquadramentos, invadidos pela luminosidade extrema do campo nevado. Embrulhado em sua colorida roupa de frio, Takara não parece cercado por uma equipe e empenhado numa encenação. A câmera submete-se ao ritmo natural da infância, aos gestos erráticos, às indecisões e vacilações do menino. Ele está sozinho.

Sem uma fala sequer, o filme explora a expressividade do silêncio. O não verbal potencializa o visual, que é onde TAKARA prefere esculpir sua singela observação de um empreendimento infantil.

Deixe um comentário