É Tudo Verdade: Fernanda Young, Foge-me ao Controle

por Paulo Lima

A personalidade vertiginosa e rebelde de Fernanda Young parecia não caber em suas múltiplas facetas de escritora, atriz e roteirista. Mostrá-la em todas as suas dimensões é o desafio encarado pelo documentário Fernanda Young, Foge-me ao Controle, da diretora Susanna Lira.

Sua rebeldia é exposta já na cena de abertura. Fernanda aparece excursionando pelo Atacama, deslumbrada com a paisagem, mas sem paciência para o blá blá blá do guia. “Esse cara falando o tempo inteiro essas informações que nem aprendi no segundo grau. Não interessa! Eu quero comungar com a natureza, ficar de boa”, reclama ao marido Alexandre Machado. “Acho que a reclamação é um movimento otimista.”

A partir desse ponto, o que se tem é um turbilhão de imagens dispostas nos mais diversos formatos – fotos, trechos de entrevistas, instalações – que buscam retratar, por meio de recortes, colagens e sobreposições, a energia frenética da personagem e suas metamorfoses caracterizadas por constantes mudanças de visual.

Fernanda Young expunha com despudor as muitas faces de seu inconformismo contra tudo o que parecia cafona e estabelecido, numa atitude punk. “Ser punk é ter uma inquietude na alma incontornável”, diz. Essa inquietude era extravasada sobretudo pela literatura. Considerava-se em primeiro lugar escritora, forma de expressão que descobrira muito cedo, embora não fosse dessa forma aceita, por dedicar-se a muitas coisas e por não “reverenciar os coronéis da literatura”. O reconhecimento viria meses depois de sua morte, ocorrida em 2019, provocada por uma crise de asma seguida de parada cardíaca. O assunto da morte, sensivelmente, não foi explorado por Susanna Lira no filme. Fernanda ganhou um prêmio Jabuti póstumo na categoria Crônica, por seu livro Pós-F: para além do masculino e do feminino, um entre os 15 que chegou a escrever.

“Sou uma bem-sucedida libertária”, traduz a si mesma em outro momento. E esse sucesso pode ser também creditado ao seu trabalho de roteirista de séries como Os Normais, Os Aspones, Surtadas na Yoga e Shippados, e de apresentadora e integrante de programas de TV, como Irritando Fernanda Young e Saia Justa. Mas também por antecipar muitas questões que viriam ocupar o espaço público. Ela tinha consciência de que se debatia com desafios que estavam além do seu tempo: “Escrevo para muitos anos depois.” Olhando pelo retrovisor, ela rememora a juventude vivida nos anos 1980, quando só existiam para os jovens duas opções: ou ser babaca ou doidão. Ela escolheu a segunda alternativa, na qual mergulhou enfrentando traumas de abuso sexual na adolescência, dislexia e depressão.

“Gosto de ser lambida pela coragem”, diz a certa altura. E com coragem e paixão (“eu sou absolutamente apaixonada e sofro de amor desde sempre”), venceu barreiras e tabus. Como se seu próprio nome já vaticinasse, Fernanda Young viveu jovem, morreu jovem e permanecerá eternamente jovem.

Paulo Lima

07/04/2024 às 20h30 – Espaço Itaú de Cinema Augusta
08/04/2024 às 19h30 – Cinemateca Brasileira (Sala Grande Otelo)
11/04/2024 às 20h30 – Estação Net de Cinema Botafogo
12/04/2024 às 17h30 – Estação Net de Cinema Rio (Sala 5)

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