O chato de óculos

Para quem leu esses últimos microcomentários sobre filmes que postei nas redes sociais, eu devo parecer um chato de óculos. Mas que fazer quando os filmes que tanta gente ama a mim não agradam?

Não me avexo nem um pouco de admitir que achei o FAUSTO do Sokurov um pé no saco. Uma versão contorcionista da história de Goethe, verborrágica, com a agravante de ser dublada em estúdio para garantir a frieza “antinaturalista”. A montagem sabota todas as tentativas do público de se conectar com o que vê. As imagens distorcidas, tão lindas e apropriadas em MÃE E FILHA, viraram uma mania vazia, enjoativa e sem critério. Expressionismo anacrônico com aquelas cores de vômito que Sokurov tanto aprecia. Idiossincrático, foi feito para os fãs incondicionais e júris de festivais que se intimidam com a assinatura do diretor. Dura 133 minutos, mas parece se estender por 133 horas. Excetuando-se algumas imagens bonitas, acho que o inferno em si seria mais palatável.

Não entendo o que meus coleguinhas críticos estão vendo de especial em MINHA IRMÃ. Na maior parte do tempo, me pareceu um draminha medíocre, tanto na forma como na dramaturgia. O garoto tem maturidade, é bom ator. Há dois ou três momentos interessantes no relacionamento dele com a tal “irmã”, mas o resto me pareceu um vai-vem entediante entre a montanha e a cidade, o naturalismo blasé e as obviedades de melodrama (a procura da mãe, por exemplo). A cena do menino ferido tem um erro de continuidade pavoroso. Além do mais, vamos parar com isso: nem tudo pode ser engolido como “metáfora da crise europeia”. Se é metáfora, é metáfora dos novos tempos: pobre.

Eu já temia, mas resolvi arriscar. E me arrependi. PROMETHEUS é um pé no saco. Blockbuster pretensioso para mentes infantis que gostam de brincar de Ipad com geleca. Blablablá, pseudomisticismo de gibi vagabundo, monstros gosmentos saindo de dentro de outros monstros gosmentos, ridículas cabeças falantes e uma aspiração patética a reeditar 2001. Ridley Scott caiu na vala comum da nova ficção científica, que faz muito barulho mas é incapaz de dizer qualquer coisa que preste sobre o mundo.

4 comentários sobre “O chato de óculos

  1. No modo de ver deste cinéfilo que há pouco chegou aos 70, que alcançou grandiosas obras realizadas por grandíssimos cineastas, o cinema atual está em crise e qualquer filme apenas bom (ou até mediano) é considerado uma obra-prima por muita gente.

    • Olá, Francisco. Embora esteja “apenas” me aproximando dos 60, compartilho da segunda parte de sua opinião. Mas não creio que o cinema esteja em crise. Pode não estar em um de seus momentos áureos (fins dos anos 1930, pós-II Guerra, anos 60 e 70) mas acho que há muitos filmes bons por aí. Esses aqui é que estão enganando muita gente, de fato.

  2. O que fazer quando os filmes que tanta gente ama não nos agradam? Assumir que somos do grupo “Chatos de Óculos”. Vc cunhou um novo nome para um antigo tipo de cinéfilo, aquele que ama o cinema mas só ama os filmes que considera bem acima de média (e até pode achar com o Ptere Bogdanovich – um “chato de cachecol” – que “todos os filmes bons já foram feitos”, etc etc. Somos assim, cada qual com suas isidissincrasias: eu gostei muito de “Minha Irmã” e achei o que vc achou de fraco neste filme em outros que vc adorou (“Neves do Klimanjaro”, por exemplo). Já de Prometheus a Fausto, nada a discordar… Abraços, bom fim de semana. Filmes melhores virão (…ou não)

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