Pílulas na rede 12

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FUTURO DO PRETÉRITO: TROPICALISMO NOW tenta conciliar duas agendas: lembrar o movimento original através de depoimentos formais e apontar sua reanimação através das performances. Elege São Paulo como meca de um Digitropicalismo (o termo é meu) plasmado nas misturas e remixes da cultura digital. O corpo ausente de Caetano é um fato a se notar, pois é Gil quem encarna melhor esse novo momento. É interessante perceber também que, enquanto TROPICÁLIA estava preso ao passado e explorava a estética da época, o filme de Ninho Moraes e Francisco Cesar Filho procura uma estética também “atualizada”, em cima de incrustações digitais, espelhamento de telas, um clima permanente de instalação e sonoridades ligadas à vanguarda paulistana em voga. Os dois filmes juntos ficam melhores do que cada um separado.

Esse 007 aí (OPERAÇÃO SKYFALL) não está mais humano, só está mais cansado. Também pudera, com toda aquela correria. Agora que a inteligência ficou para os computadores, resta a James Bond correr como um maratonista para tirar o atraso do tradicional agente secreto. Mas o filme ainda tenta canhestramente “relativizar” as coisas, mostrando que o nerd vale menos que o sabichão das antigas. De qualquer forma, a volta à Escócia é um achado de roteiro e o vilão de Javier Bardem é uma diversão à parte. De resto, tudo continua a funcionar na base da ação+design+cenários extravagantes. O rifle com as letras AB referem-se ao pai de Bond mas também ao produtor Albert Broccoli, produtor dos 15 primeiros filmes da série.

Na sequência de uma série de documentários sobre grandes brasileiros em DVD, a FBL Produções de Rozane Braga vem de lançar PORTINARI DO BRASIL. Trata-se de uma biografia ilustrada com trechos das memórias do pintor, uma pletora de seus quadros e murais, e ainda alguns materiais de arquivo. Não gosto dos efeitos de fusão decorativa nem da trilha musical onipresente e repetitiva, mas o filme tem seu valor didático. Sobretudo nos extras que exploram as facetas de Portinari como ilustrador, muralista e pintor sacro. Apesar do tom laudatório, dá para perceber as contradições que o situaram entre a admiração mais irrestrita e as críticas ao seu realismo socialista à brasileira e à filiação de seu estilo à pintura europeia.

Há cineastas que, ao filmarem em países diferentes do seu, levam pouca bagagem. Ou seja, adaptam-se aos temas e ao jeito de filmar de cada lugar. Fernando Meirelles, por exemplo, não leva muita bagagem. Outros levam tudo consigo. Woody Allen é sempre Woody Allen, esteja nos EUA ou na Europa. Abbas Kiarostami também. Na Toscana ou agora em Tóquio, em UM ALGUÉM APAIXONADO, o iraniano faz tudo do seu jeito: muita conversa em deslocamento, uma relação intensa entre cenários e questões individuais, os personagens partidos numa ambiguidade fundamental. Se nos filmes iranianos eles se dividiam entre cinema e realidade, documentário e ficção, em CÓPIA FIEL eles estavam com um pé na vivência e outro na encenação. Nesse novo filme japonês, todos combinam duas dimensões aparentemente contraditórias na sua vida normal. Abbas, porém, é o de sempre, não importa o idioma.

É bonita a evocação que Luiz Carlos Lacerda fez de Lúcio Cardoso, seus diários e suas poucas cenas realizadas como diretor em A MULHER DE LONGE. O texto é lindo e fornece uma cadência meditativa. A revisita aos cenários do filme de 1949 tem belíssimas imagens que dialogam com uma certa tradição do cinema praiano brasileiro. Há um teia de referências a outros filmes baseados em Lúcio, algo que pode confundir o espectador menos avisado. Mas isso serve para ressaltar a unidade daquele universo lúgubre, onde, a meu ver, não cabe bem o romântico Chopin que Bigode usa bastante na trilha. Também questiono as tomadas muito estendidas na Cinemateca Brasileira e no prólogo e créditos finais, que parecem ter a função de levar o filme à metragem longa.

Ben Affleck continua um ator apático que tenta usar a inexpressividade para fingir inteligência. Mas como diretor é surpreendente que responda tão bem ao padrão industrial dos thrillers de resgate em ARGO. Muitos dos méritos vão para o roteirista Chris Terrio, que combinou à quase perfeição a comédia de sátira hollywoodiana com os aspectos graves da escapada política. O filme é um primor de síntese na descrição do Irã “revolucionário” aos olhos estrangeiros, e não há por que não crer que a barra estivesse pesada mesmo como aparece na tela. Mas Afflek também revela uma ótima mão na regência dessa orquestra em que nada desafina.

A estilização embeleza e moderniza BOCA, mas também tira um bocado do espírito que era de se esperar de um filme sobre a Boca do Lixo dos anos 50 e 60. Flavio Frederico decalca filmes de gangster, emula o glamour das máfias hollywoodianas e se dá muito bem com o elenco. O roteiro, porém, acaba se repetindo nas cenas de tocaias e sexo. A coisa vai se resfriando, sem que a gente se aproxime da alma do Hiroito nem do ambiente em que ele viveu. Podia ser um Boca de ouro, mas para o meu gosto estacionou no bronze.

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