O FIO INVISÍVEL na Netflix
A peruana Claudia Llosa despontou para a fama com dois filmes embebidos no realismo fantástico latino-americano. Madeinusa e A Teta Assustada lidavam com crendices populares transformadas em histórias de mistério e danação pessoal. O segundo, especialmente, impressionava pela fixação de uma atmosfera inquietante e uma fatura audiovisual muito sugestiva. Além disso, ambos lançavam a magnífica atriz Magaly Solier.
Em O Fio Invisível (Distancia de Rescate), Claudia mantém-se de certa forma fiel a esses vínculos, assim como a processos vitais ligados à feminilidade. Amanda (María Valverde) e Carola (Dolores Fonzi) são duas mães vizinhas no campo durante um verão. Os cuidados de Amanda para com a filha tomam proporções extremas à medida que ela se deixa impressionar pelo relato de Carola a respeito do seu filho. O menino, acometido por uma intoxicação grave, teria passado por uma “migração” de espírito e sobrevivido à custa de uma estranha transformação.
A história prossegue nas adjacências do terror, impulsionada por uma conversa recorrente em off entre Amanda e o garoto – algo que pode se situar apenas no campo da imaginação. É tudo pretensamente intrigante, mas na verdade apenas confuso. Uma catástrofe ambiental nos trigais, uma epidemia de deformidades congênitas (deploravelmente representada por crianças portadoras de Síndrome de Down), uma curandeira e uma atração incompreensível de Amanda por Carola são ingredientes que se chocam, insinuando que estariam melhor concatenados no romance original de Samanta Schweblin, que participou da adaptação.
A ideia central é o fio invisível que mantém as mães presas a seus filhos, sempre preocupadas com sua segurança (a “distância de resgate” referida no título original). O tema, porém, vem sobrecarregado de simbologias, entre as quais um centauro, intrusão de vermes no corpo e inundações de líquido amniótico. Apesar da mise-en-scène elegante, o filme resulta poluído conceitualmente e um tanto aborrecido.