Perlov, entre Israel e o Brasil

Se existe alguma relação entre o Brasil e o cinema israelense, ela atende por um nome e um sobrenome: David Perlov (1930-2003). O cineasta, nascido no Rio de Janeiro, crescido entre Belo Horizonte e São Paulo, estabelecido ainda jovem na Europa e depois em Tel-Aviv, foi um pioneiro desse tipo hoje comum de documentário que vê o mundo através de um prisma pessoal, familiar, intimista.

Seus famosos Diários 1973-1983, criadores de toda uma dramaturgia documental a partir das janelas de seu apartamento e da “janela” da TV, chegaram a ser exibidos no Festival do Rio de 2006 (leia aqui meu texto da época). Mas a partir de amanhã (sexta) o Instituto Moreira Salles (Rio) supre de vez uma lacuna grave na cinefilia brasileira: toda a obra de Perlov será exibida na Mostra David Perlov: Epifanias do Cotidiano. Veja aqui a programação completa.

Além dos Diários, retomados nos Diários Revisitados (1990-1999), a mostra traz pela primeira vez ao Brasil clássicos como Em Jerusalém, média de 1963 apontado como marco do moderno cinema israelense, e Biba, de 1977, retrato igualmente inovador de uma viúva da Guerra do Yom Kippur. Os docs de Perlov enfocam a vida nos kibutzin, questões do Holocausto e a política israelense, sempre a partir de uma perspectiva pessoal e independente, que se adensa especialmente nos Diários. Em seu filme-testamento, Minhas Imagens 1952-2002, ele prestou um tributo à fotografia, outra de suas grandes paixões além do cinema e da poesia. O vínculo com suas origens brasileiras foi frequentemente tematizado nos Diários.

Desenho de Perlov

A retrospectiva, promovida pelo Centro da Cultura Judaica, a Cinemateca Brasileira e o IMS, conta com a fina curadoria de Ilana Feldman, uma das mais inteligentes estudiosas do documentário no Brasil. Junto com Patrícia Mourão, Ilana também editou o belo catálogo da mostra. Seu texto desvenda tanto os pontos fortes da biografia de Perlov (aluno de Lasar Segall, assistente de Henri Langlois), como do seu cinema, “caracterizado pela tensão entre o público e o privado, o cotidiano e o sagrado, o poético e o político, a história coletiva do século 20 e sua fascinante jornada pessoal”.

Mira Perlov por Lasar Segall

O catálogo bilingue contém ainda textos de Alberto Dines, Paulo Emilio Salles Gomes e dos críticos, professores ou artistas Uri Klein, Dominique Bluher, Gregorio Martin Gutiérrez, Noa Steimatsky e Shuka Glotman, além de trechos de entrevistas e depoimentos do próprio cineasta. Outro destaque é uma seleção de desenhos de Perlov, sua primeira prática artística, aperfeiçoada em Paris na Escola de Belas Artes e no ateliê de Arpad Szenes e Vieira da Silva.

A programação da mostra contempla um encontro especialíssimo, no sábado, às 18h30, com Mira Perlov, viúva de David, personagem e produtora dos seus Diários, e que foi também modelo de Lasar Segall. No dia 15 (terça), às 19h30, haverá uma mesa-redonda sobre a obra de Perlov reunindo Ilana Feldman e Eduardo Escorel.

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