Ernesto e as pré-estreias online

Marcélia Cartaxo em “Pacarrete”

Fechadas há quase três meses e diante de um longo e tenebroso inverno pela frente, as salas de cinema estão buscando formas de sobrevivência. Os exemplos são diversos. O Circuito Estação, no Rio, apostou na futura reabertura para lançar uma campanha de crowdfunding (contribua aqui). A Sala Petra Belas Artes, em São Paulo, conta com plataforma própria de exibições online e juntou-se à Prefeitura paulistana no recém-inaugurado drive-in, localizado no Memorial da América Latina.

O site Cinema Virtual vende ingressos para exibições online, beneficiando a sala de cinema que o espectador escolher, como se estivesse indo até lá para ver o filme. Já o Espaço Itaú de Cinema começa a promover hoje (sexta, 19/6) um festival virtual de pré-estreias de filmes brasileiros e estrangeiros com ingressos a 10 reais. Cada filme fica “em cartaz” por dois dias.  .

O cardápio inclui filmes bastante esperados, como Aos Olhos de Ernesto, de Ana Luiza Azevedo, Três Verões, de Sandra Kogut, Piedade, de Claudio Assis, A Febre, de Maya Da-Rin, Pacarrete, de Allan Debberton, Querência, de Helvécio Marins Jr. e Mangueira em Dois Tempos, de Ana Maria Magalhães. Entre os títulos internacionais, cabe citar O Orfanato, do afegão Shahrbanoo Sadat, e Alice Guy-Blaché: a História não contada da primeira cineasta do mundo, de Pamela B. Green. Programe-se aqui.

A seguir, um comentário sobre Aos Olhos de Ernesto.

Esse filme é como um bonito solo de violoncelo pontuado aqui e ali por leves toques de flautim. Passa-se em Porto Alegre, mas é como se mirasse o tempo todo a melancolia suave de Montevidéu. Trata desses riscos que estamos dispostos a correr em troca de bons momentos que minorem a nossa solidão.

Assim é com o viúvo Ernesto (Jorge Bolani), fotógrafo aposentado que vive sozinho há 46 anos num apartamento da capital gaúcha, de onde não pretende arredar o pé. Está perdendo a visão e tem como únicas companhias um vizinho argentino (Jorge d’Elia) e a faxineira que vem uma vez por semana (Áurea Baptista). Sua vida começa a mudar de rumo quando ele cruza o caminho com Bia (Gabriela Poester), jovem e expansiva cuidadora de cães.

Com seus olhos grandes e uma habilidade especial para entrar na vida alheia, Bia logo estabelece com Ernesto um pacto não declarado de ajuda mútua por caminhos mais ou menos tortuosos. Isso inclui reativar, através de cartas, uma relação de afeto que emerge do passado do velho senhor.

Há uma amável troca de fluidos entre a sabedoria da velhice e a energia da juventude, sem cair nos clichês habituais desse tipo de argumento. Para isso contribuem a ótima qualidade dos diálogos, a direção delicada de Ana Luiza Azevedo e a competência dos atores. Nesse quesito destaca-se a química entre Gabriela Poester, incrivelmente espontânea, e Jorge Bolani, perfeito ao expressar as fragilidades de Ernesto.

Consta nos créditos a consultoria do escritor Senel Paz no roteiro, escrito a quatro mãos por Ana e Jorge Furtado. O filme conta também com várias referências ao poeta uruguaio Mario Benedetti e dois belos momentos valorizados por Caetano Veloso cantando em espanhol. É obra de plena maturidade no manejo equilibrado das emoções e na coesão de todos os elementos.

AOS OLHOS DE ERNESTO estará em cartaz sábado e domingo, 20 e 21 de junho no

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