O melhor diálogo de Pleasure passa no trailer e vem antes do título. Linnéa está chegando da Suécia, e o oficial da imigração em Los Angeles lhe pergunta “Business or pleasure?”. Ela responde, maliciosamente, “pleasure”. Aos 19 anos, entediada da vida na terra natal, Linnéa vai tentar uma carreira em L.A. Com o nome “artístico” de Bella Cherry, ela almeja nada menos que ser “a próxima estrela do cinema pornô”.
Pleasure tem sido recebido como um estudo de voyeurismo antropológico, radiografia de uma indústria eminentemente machista, misógina, racista e grosseira. Bella é a personagem-guia, colocando em teste sua resistência às humilhações e violências sexuais em nome de uma mescla ambígua de ambição e exibicionismo. Há, porém, limitações óbvias às intenções da diretora Ninja Thyberg, ao que parece uma especialista no tema, haja vista seu filme anterior, Hot Chicks, que também abordava a objetificação erótica de mulheres.
Estou longe de conhecer aquele universo, mas me parece bastante excessiva a forma como ela retrata a toxicidade da cena pornô. Para conquistar uma fanbase e seguidores nas redes sociais, Bella Cherry tem que se submeter ao sexo hardcore. À medida que a moça avança no seu propósito de topar cenas cada vez mais agressivas, isso se transforma na medida do êxito, como se todo o cinema pornô tendesse para o extremo, ou seja, o sadismo e a pura escatologia.
De outra parte, Pleasure nos oferece uma dramaturgia tão rala quanto a de filmes pornôs que pretendem contar uma historinha. Bella confraterniza com outras “modelos”, investe na conquista de um agente poderoso e aprende que a hora da cena é uma boa oportunidade para se vingar dos desafetos. Isso dá margem a algumas sequências constrangedoras, não só pelo que acontece, mas também pela forma como são filmadas.
A crueza pode ter sido a forma justa para mostrar um meio alegadamente torpe. Mas a simples banalidade estética não justifica tal escolha. Uma tacada certeira foi escalar a atriz iniciante Sofia Kappel, que faz um trabalho desafiador contracenando com atores pornôs em simulações decupadas de maneira bastante óbvia. O amoralismo da personagem sabota qualquer forma de identificação e permite que, através dela, se veja o entorno. Pena que esse entorno seja tão raso e unidimensional.
>> Pleasure está na plataforma Mubi.