DENTRO DA CASA (Dans la Maison) entra em cartaz amanhã. É um thriller bem-humorado com diversas referências contemporâneas que transcendem os meros reality shows. Vejo mais as vidas vicárias que projetamos na arte, especialmente na literatura e no cinema. Nisso somos sempre voyeurs e projetamos na obra nossos desejos. François Ozon cria uma cadeia de voyeurismo entre um jovem carente, a família de classe média que ele observa e sobre a qual escreve suas redações escolares, o professor e sua esposa que as leem e fazem disso um vício, e finalmente o espectador na ponta da cadeia. O que começa como uma versão francesa da polêmica do Enem brasileiro se torna aos poucos uma investigação mezzo Truffaut, mezzo Hitchcock da representação literária e suas perversões. Pena que o roteiro não sustente a pegada até o final. Gradualmente vai perdendo o rumo, entrando pelo irrealismo fácil e terminando em janelas indiscretas abertas para o óbvio.
Tenho amigos que dizem ter se divertido muito com VAI QUE DÁ CERTO. Tudo bem, cada um se diverte como se diverte, e pronto. Mas vamos combinar: não basta uma comédia não ser péssima para ser boa. Essa aí tem certos cuidados de ritmo, atuações aceitáveis e meia dúzia de momentos que valem uma risadinha. Mas isso não dá nem pra começar uma conversa. Na maior parte do tempo, é infantilismo de humor televisivo, situações dramatúrgicas desperdiçadas, gritaria e movimentação frenética sem humor. A boa comédia é coisa séria: precisa de dramaturgia, falas inteligentes, lances surpreendentes. Precisa ter gume e ousadia. Não basta reciclar clichês como brincadeirinha entre amigos num pequeno circo doméstico. O risco é sempre eles se divertirem muito mais do que o público. Mas vai dizer isso pra Globo Filmes…
Enfim, um filme americano adulto. Em sua concentração teatral, KILLER JOE sabe jogar com as perversões e expectativas do público. Sabe lidar com as taras de um plateia masculina e subvertê-las de uma hora para outra. Sabe administrar o desejo de violência, mas, no momento M, usar a violência de uma maneira inesperada e desconcertante. Há quanto tempo você não via três púbis frontais nos primeiros 15 minutos de um filme americano? Tirando Tarantino e Irmãos Coen, desde quando você não via uma cena tão insólita quanto aquele “jantarzinho em família” com frango frito do KFC? Tudo bem que a gente já tenha visto esses personagens em outros filmes do gênero. Mas aqui eles estão nos seus “melhores” dias. Roger Ebert saiu do cinema sem saber se tinha amado ou odiado o filme. Roger Ebert está morto agora, mas William Friedkin cruzou a fase obscura e está vivo de novo.