YARA
“Resgatar a inocência perdida do cinema” – essa foi a intenção do diretor iraquiano Abbas Fahdel ao realizar quase todas as funções técnicas de YARA. Ele se inspirou em Robert Bresson e no seu xará Kiarostami para criar a história de um romance casto entre uma jovem órfã que vive isolada com a avó num vale do norte do Líbano e um rapaz que aparece ali por acaso.
No elenco inteiramente de amadores, boa parte é composta pela família da velha senhora que habita a casa servida como locação. As situações, sempre mínimas, se desenrolam a cargo do improviso dos atores e das circunstâncias no trato com os animais domésticos e insetos. Assim, os olhares documental e ficcional se conjugam com certa naturalidade, mas sem uma maior elaboração.
As intenções singelas desse projeto esbarram numa série de limitações. A começar pelo fato de que Yara (Michelle Wehbe) não encarna alguém que habita aquele lugar tão remoto, nem a ela foi alocada uma cenografia condizente com seu espírito de menina. Suas relações com a avó soam muito formais para quem vive junto há um tempo razoável. O namoro, que se prolonga sem um único beijo, também parece forçadamente idealizado, sobretudo se considerarmos o comportamento mais moderno de Elias (Elias Freifer).
Os dois pombinhos passeiam juntos pelo vale, exploram algumas construções desocupadas e passam o tempo esbanjando inocência enquanto lhes é permitido estar perto um do outro. Tudo ocorre no ritmo sonolento daquelas montanhas, como se toda a agitação do mundo estivesse em um planeta distante.
Abbas Fahdel descreve esse pequeno mundo (a “prisão” de Yara) com uma gramática repetitiva, pontuada por um excesso de tomadas ascendentes em direção às montanhas, às roupas no varal e às imagens de santos nas paredes da casa; e descendentes em direção à roça e aos animais. A linguagem se torna rapidamente um cacoete simplório em vez de um distintivo autoral.
Se o diretor pretendia resgatar a inocência do cinema, YARA ficou apenas num exercício trivial de ingenuidade cinematográfica.