Festival do Rio: “Saudade do Futuro”

Recomendo a quem for ao festival algumas medidas essenciais: lembre-se de levar o seu comprovante de vacinação, que pode ser o certificado digital do ConecteSUS ou o comprovante em papel. Sem isso, a entrada nos cinemas não será permitida. Chegue de máscara e mantenha-a cobrindo o nariz e a boca durante todo o filme. Procure guardar o maior distanciamento possível entre as poltronas ocupadas.

Anna Azevedo venceu o Festival de Brasília com Saudade do Futuro, seu primeiro longa solo. Eis uma cineasta de grande fôlego estético e escolhas bastante ecléticas, que aparecem em curtas como Dreznica, Geral e Vento de Sal. Anna está sempre pronta a mesclar a documentação direta com experimentações na textura e na densidade de suas imagens.

Esse longa sobre a cultura da saudade traz essas mesmas características, apesar de um tanto diluídas numa estrutura fragmentada. O tema da saudade emerge esgarçado entre relatos e reflexões de personagens muito diversos filmados em três países.

Portugal, pátria da saudade, ocupa a maior parte dos 73 minutos do filme. O mar assassino está sempre por perto nas conversas sobre a morte dos que partem nas águas e o luto dos que ficam. Mulheres anônimas e escritores como Valter Hugo Mãe falam do assunto. A opinião de crianças sobre a saudade, não raro surpreendentes, é um dos elementos comuns a esse filme e ao relativamente similar Ossos da Saudade, de Marcos Pimentel.

No Brasil, indígenas guaranis comentam sobre o sentido da saudade, Martinho da Vila relembra a tristeza dos escravos trazidos para o Brasil e três mães deploram a perda de seus filhos, incluindo Marielle Franco. Dois slamers elaboram sobre a saudade de um futuro anunciado para o país e que nunca veio.

Em Cabo Verde, a pauta se desvia mais para o recente empoderamento das mulheres, envolvendo escritoras, meninas e performers musicais da comunidade dos Rabelados, grupo tradicionalista hoje em risco de extinção.

A costura entre esses blocos é tênue e se dá sobretudo pelas implicações políticas de cada caso. Ainda assim, o tema da saudade periga escapar em muitos momentos, especialmente numa sequência gravada com crianças na instalação do Morrinho e em praticamente todo o bloco de Cabo Verde. À falta de uma liga mais consistente, é preciso ajustar o nosso foco para os esboços de pensamento expostos em cada cena e para a beleza plástica e as derivas poéticas que a diretora fartamente oferece.

3 comentários sobre “Festival do Rio: “Saudade do Futuro”

  1. Só alguém com um olhar muito amplo usa palavras como textura, costura e esgarçamento, termos do lugar da plástica, numa crítica de cinema.
    Carlos Alberto de Mattos é, definidamente, bambú e não palmeira!

  2. Feliz em ler que o meu pensamento sobre o filme coincide com o do Mestre. Cada vez mais vejo como fazer documentário é difícil devido a quantidade de documentários existentes. Não basta juntar algumas falas. A “liga” citada pelo amigo Mestre é necessária para não parecer uma colcha de retalhos. Não vi todos os longas do Festival de Brasília, ,mas será que este seria o melhor filme?

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