É Tudo Verdade: ‘Máquina do Desejo’ e ‘Yaõkwa: Imagem e Memória’

Exibições gratuitas: Plataforma Looke. ‘Máquina do Desejo’ – 10/04 às 21h00 e 11/04 às 15h00 durante 24 horas
‘Yaõkwa: Imagem e Memória’ – 10/04 às 13h00 durante 24 horas

Um belo esforço de pesquisa e montagem traz a história do Teatro Oficina sem ceder ao didatismo. Máquina do Desejo: Os 60 Anos do Teatro Oficina deixa-se imantar pelo caráter dionisíaco do material audiovisual existente e dispensa entrevistas ou depoimentos formais. As cenas de arquivo de 60 anos de trajetória se articulam numa voragem de imagens e sons, aditivados por um tratamento sonoro (com música de Guilherme Vaz) que estimula os sentidos.

Apesar da aparente anarquia, há uma ordem sutil que conforma uma narrativa. Isso é organizado pelas falas em off de Zé Celso e outros personagens não identificados (afinal, é a voz de um coletivo que se projeta contando sua própria história). É por essa pista que seguimos o percurso do Oficina desde os tempos inaugurais com Eugenio Kusnet (ator, diretor e professor identificado com o teatro clássico), que foi um misto contraditório de inspirador e antagonista. Os tempos de guerra contra a burguesia, a ditadura e a censura vieram com O Rei da Vela, Roda Viva, Galileu Galilei e Na Selva das Cidades , que desestabilizaram não só os lugares de palco e plateia, como a própria ideia de espaço teatral. O incêndio de 1966 e a reconstrução do teatro atribuem ao Oficina um status de fênix.

O grupo prosseguiu em seu projeto de descolonizar o teatro brasileiro nos anos 1970 até a prisão, tortura e exílio de Zé Celso em Portugal e África. Máquina do Desejo incorpora trechos extensos do documentário experimental 25, realizado por Zé Celso no Moçambique recém-independente. De volta ao Brasil em 1979, ele se engaja numa longa luta de preservação do galpão do Bexiga, que ser estende até hoje, numa disputa com o conglomerado de Silvio Santos.

As célebres montagens de Hamlet, Cacilda, As Bacantes e Os Sertões dão provas da resistência de uma forma de teatro livre e subversiva que reverbera as máximas de Oswald de Andrade adotadas por Zé Celso: “misturar a contribuição de todos os erros do país e condensar todas as revoltas numa só direção”.

O documentário de Lucas Weglinski e Joaquim Castro descreve essas seis décadas de criação e procriação sem trair a verve revolucionária e hedonista do Uzyna Uzona. É um feito e tanto.



Parte essencial do trabalho da ONG Vídeo nas Aldeias é a devolução aos indígenas das imagens coletadas nas tribos. Com esse princípio, Vincent Carelli e suas equipes construíram uma reputação irretocável no campo da Antropologia Visual. O curta Yaõkwa: Imagem e Memória, assinado por Vincent e sua filha Rita Carelli, é mais uma “cerimônia” de retribuição.

Nesse projeto viabilizado pelo Rumos do Itaú Cultural, os realizadores levaram até a aldeia Enawenê-nawê do Mato Grosso uma série de vídeos gravados nos anos 1990 para servirem de “memória” para os mais jovens. Com a morte prematura dos mais velhos, os cantos do cerimonial Yaõkwa haviam sido esquecidos. Os vídeos ajudam a recuperá-los. Assim, o curta combina as danças e cantos das duas épocas, ao mesmo tempo em que a equipe orienta os Enawenê-nawê a usarem câmeras e computador fornecidos pelo projeto.

Como outros tantos trabalhos da Vídeo nas Aldeias, Yaõkwa se apoia não somente na passagem de informação, mas destaca também as emoções envolvidas no processo. É sempre cativante ver o prazer com que os indígenas veem seus antepassados na tela ou a malícia de suas brincadeiras e referências ao sexo. O lúdico é a forma natural de viver a vida e expressar seu universo.

2 comentários sobre “É Tudo Verdade: ‘Máquina do Desejo’ e ‘Yaõkwa: Imagem e Memória’

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