FILHAS DO SOL
FILHAS DO SOL se inspira livremente num período dramático da história dos curdos iraquianos, quando o grupo étnico-religioso dos Yazidi foi barbaramente perseguido pelo Estado Islâmico, entre 2014 e 2015. A história de Bahar (vivida pela iraniana Golshifteh Farahani) ilustra os horrores sofridos pelas mulheres naquele contexto: viu o marido ser fuzilado sumariamente, o filho ser levado para uma escola de meninos-soldados e a irmã mais nova ser brutalizada tragicamente. Além disso, foi sequestrada e vendida como escrava sexual antes de ser libertada para se tornar líder de uma pequena brigada de mulheres guerrilheiras.
Todos esses fatos são narrados em flashbacks a partir de uma ação da brigada para retomar uma cidade no Norte do Curdistão iraquiano. As cenas de combate, apesar de pontuais e tímidas, situam a francesa Eva Husson entre as poucas mulheres que dirigem filmes de ação. No entanto, FILHAS DO SOL não se enquadra exatamente no gênero filme de guerra. É antes um drama sobre família e maternidade com um conflito no meio.
Bahar não parece lutar por uma causa coletiva, mas para vingar suas perdas familiares. A insistência em avançar rumo à tal cidade oculta sua esperança de lá encontrar o filho extraviado. Numa cena, após abater um soldado inimigo, ela solta um grito feroz de revanche. Nada que não possa ser comparado à sanha de Charles Bronson que gerou o subgênero “Desejo de Matar”. A vingança, no caso, é dupla, uma vez que os combatentes do Estado Islâmico acreditam que perdem o paraíso se forem mortos por uma mulher.
Ao lado de Bahar está a correspondente de guerra francesa Mathilde (Emmanuelle Bercot), que também tem seu histórico de desgraças: perdeu um olho e o marido na guerra da Síria e está longe da filha. Essas similitudes vão formar um laço tênue entre as duas corajosas mulheres, cujos diálogos servem somente para desvendar suas respectivas histórias. O tema da maternidade se acentua numa das sequências mais tensas do filme, que relata o parto difícil de uma fugitiva num ponto de fronteira.
Excessivamente cautelosa, Eva Husson evita criar vínculos diretos entre seu filme e a realidade do genocídio Yazidi, interrompido somente pela intervenção do governo Obama. Tudo soa genérico demais, como num telefilme que se poupasse de riscos. O roteiro se estende na rememoração do caminho de Bahar até ali, mas não esclarece como uma advogada burguesa se transforma na prática em comandante guerrilheira habilidosa com armas e estratégias.
Ao fim e ao cabo, FILHAS DO SOL (tradução tola do original Les Filles du Soleil, que significa Meninas do Sol) é drama um tanto lacrimoso que coloca as mulheres como seres voltados prioritariamente para seus assuntos pessoais. Um olhar redutor sobre o feminino.