50 anos de ginga e chinfra

TREM DO SOUL no Recine até 13/10

“Vou erguer minha voz, deslizar os meus pés”, anuncia a música que dá título a Trem do Soul, documentário sobre o movimento da soul music nos subúrbios do Rio de Janeiro. Nos anos 1970, os seguidores cariocas de James Brown fizeram bonito nos bailes com a música black de extração americana e a dança em grande parte inventada por aqui mesmo. O filme já passou em dois festivais online e deve aparecer brevemente em alguma plataforma perto de você.

Clementino Júnior, cineasta responsável pelo Cineclube Atlântico Negro, partiu da grande festa do Jubileu do Soul, em 2019, para levantar as histórias de 50 anos de muita ginga e muita chinfra. A velha guarda do soul carioca, representada por figuras icônicas como Dom Filó, Gerson King Combo (1944-2020), Zezzynho Andrade e Carlos Dafé, conta como o gênero passou dos brancos da Zona Sul para os pretos da região metropolitana num misto de apropriação e empreendimento. Nascia a black music brasileira.

O roteiro da cineasta e antropóloga Milena Manfredini, estudiosa do assunto, abre espaço para se falar de um ingrediente essencial na receita do soul: as roupas coloridas e elegantes, além dos sapatos decorados feitos à mão e comprados em prestações. Pois não bastava deslizar os pés. Era preciso estar impecável, mesmo se as pistas de dança fossem imprestáveis. Dançarinas exímias como Lourdinha, Francinice, Cássia e Mônica expunham seus dotes na hora em que atacava James Brown, deixando o “love” e o beijo na boca para as músicas lentas.

A movimentação dos negros do soul era estritamente vigiada pela ditadura, como se vê nos trechos de documentos apresentados no filme. Era tida como potencialmente perigosa para a segurança nacional por “estimular o racismo no Brasil”, país onde, segundo a polícia, não havia discriminação racial. A montagem habilidosa, a cargo do próprio diretor, deixa entrever dissonâncias quanto à avaliação da política entre os próceres do movimento.

Trem do Soul tem muitas e boas cenas de dança, assim como um videografismo bem transado. É pena que a produção não tenha obtido acesso a uma pesquisa de arquivos mais extensiva e explore menos do que devia o megaencontro dos remanescentes em 2019. Mas isso não diminui o valor dessa revisita ao soul carioca nos seus anos de ouro até ser destronado pela disco music. A posterior derivação para o funk é história que fica para outro filme.

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