Três filmes que acabam de entrar em cartaz no Rio lidam com questões da juventude ou procuram algum tipo de diálogo com uma plateia juvenil: O Homem do Futuro, A Fuga da Mulher Gorila e Medianeras – Buenos Aires na Era do Amor Virtual. São três caminhos inteiramente distintos e três modelos de cinema bastante diferenciados. Eu gostaria de sair dos meus 57 anos e estar na pele de um jovem de hoje para saber qual dos três conversaria melhor comigo. Não sendo isso possÃvel fora da ficção, mando lá minhas impressões de velho crÃtico ranzinza.
O Homem do Futuro é o mais convencional como cinema de consumo, baseado em fantasias como De Volta para o Futuro e O Feitiço do Tempo. Baseado, principalmente, num formato de comédia americana em que caretas, trapalhadas e trama rocambolesca buscam um contato imediato e frenético com o público. Um cientista volta no tempo para tentar preservar a namorada da juventude, mas acaba chegando à conclusão de que é melhor não mexer na agenda do acaso – ou pelo menos não mexer muito. O filme de Claudio Torres é uma façanha técnica razoável para os padrões médios da produção cabocla, com muitos efeitos especiais e muito capricho na direção de arte e figurinos.
Mas não se pode negar também a eficiência do ritmo e da direção em geral. Após um inÃcio muito caricato, a história ganha razoável densidade para um filme do gênero, além de algumas referências cômicas interessantes. O chiste com Eike Batista, por exemplo. Wagner Moura, como sempre, faz barba, cabelo e bigode. Para o cinema brasileiro, um Wagner Moura não é mais suficiente. Então O Homem do Futuro tem três – e a contracena entre eles garante certa graça. Nada mais que chavões da ficção cientÃfica romântica, mas ainda assim um divertimento bem passável.
O outro lançamento brasileiro da semana é A Fuga da Mulher Gorila, primeira parte da trilogia Coração de Fogo, de Felipe Bragança e Marina Meliande, secundada por A Alegria (também em cartaz) e o inédito Desassossego. A Fuga talvez seja o mais redondo dos três, embora também se ressinta da apatia colorida que assola os filmes da dupla. Num road movie meio paradão, temos duas irmãs que viajam pelo interior do Rio fazendo o espetáculo da mulher-gorila e curtindo os dilemas de ser tão jovens. A mais velha é angustiada e sensual, a mais nova é lÃrica e infantil. Elas quase nunca conversam. Em vez disso, expressam-se por canções e frases aparentemente alheias.
O filme tangencia questões de representação (as roupas de gorila), de gênero (elas eventualmente dão carona a um ator desgarrado), de poder (nas relações do trio) e de cultura (o flerte supostamente poético com a música brega e a estética interiorana). Mas a rarefação das ações e dos vÃnculos entre os personagens não me permitiu um contato minimamente sólido com os sentimentos e os sintomas em jogo. Tudo o que se arma como esboço de situação é logo diluÃdo numa evasiva, numa desconversa, como se a articulação plena de qualquer ideia fosse algo a ser evitado por banal. Os jovens estão na tela, mas não parece haver uma intenção de tê-los também na plateia. Se não é assim, não sei exatamente a quem se dirige A Fuga da Mulher Gorila.
Com o argentino Medianeras ocorre algo que tem a ver com O Homem do Futuro: a viagem no tempo. Sim, porque Medianeras parece filme do inÃcio da década passada, quando se falava muito de Onde Está Waly?, solidão ao computador, o caos arquitetônico e o isolamento do indivÃduo nas grandes cidades. Quando casais predestinados demoravam um filme inteiro para se encontrar, passando por chats na internet e se cruzando diversas vezes sem se conhecer. Lembra disso? Pois é, não vejo ali material para mais do que um curta da ECA-USP dos anos 2000, mas Gustavo Taretto achou que bastava desenvolver o argumento do seu curta homônimo de 2005 para fazer novamente um filme contemporâneo. Tenho a impressão de que os jovens de hoje devem vê-lo como filme de época. Se Gramado se encantou tanto com ele, imagino como terá sido o resto da programação.
Peço uma atenção aos filmes brasileiros do programa “Desaventurados” do Kinoforum, os filmes “Cesar”, “Ratão” e momento marxista. Filmes que quebram a apatia e o vazio do cinema universitário, e que também apresentam uma ironia no trato dos dilemas dos jovens brasileiros.
Deixe uma dica de como podemos vê-los. Estão na web?
Talvez tenha coisa boa da safra de Gramado: estou cá querendo ver Riscado, Sudoeste e as Hiper-Mulheres. Só que estou sendo relapso, pois ainda não vi Transeunte.
Perder Transeunte é grave!