Greg Barker, autor de um ótimo doc sobre Sérgio Vieira de Melo, volta ao front das relações internacionais numa escala micro, enfocando um concurso anual de recitação do Corão por crianças muçulmanas representantes de diversos países. Recitar o livro sagrado do Islã é quase um pleonasmo, já que o termo Corão significa justamente Recitação. Ele foi escrito para ser dito em voz alta. Os meninos e meninas instruídos a decorar o conteúdo de suas 600 páginas ganham a promessa de destreza intelectual e sucesso nesta e na outra vida.
O filme acompanha três candidatos do Tajiquistão, das Ilhas Maldivas e do Senegal em sua viagem ao Cairo para o concurso. Todos têm dez anos de idade e, mesmo sem nenhum conhecimento do idioma árabe, trazem o Corão inteiro na ponta da língua. Crianças submetidas a provas sempre rendem narrativas cheias de suspense e afetividade. Aqui não é diferente. O carisma de Nabiollah, Rifdha e Djamil envolve completamente o espectador enquanto Greg Barker passa seu recado político.
Sim, porque Decorando o Alcorão (Koran By Heart) é um alerta civilizado, embora nada sutil, contra o recrudescimento do fundamentalismo islâmico através da educação em países tradicionalmente moderados. O menino tajique, por exemplo, conhece todo o Corão mas é semianalfabeto, já que sua educação tem sido basicamente religiosa. A menina maldívia teme ser levada pelo pai ortodoxo a sair do país para se dedicar a estudos eminentemente religiosos. A visita ao Cairo é uma pausa diferente na vida dessas crianças, mas também um possível divisor de águas em suas vidas de ídolos mirins.