Trinta dias com Hawks

Quando Peter Bogdanovich perguntou a Howard Hawks (1896-1977) se ele alguma vez considerou o cinema uma arte, a resposta foi curtíssima: “No”. E logo emendada com uma definição do cinema em mais duas palavras: “Business. Fun.”

Hawks, epíteto absoluto do cinema hollywoodiano dos anos 1930 aos 1960, terá pela primeira vez uma retrospectiva completa no Brasil. E será em Belo Horizonte, no Cine Humberto Mauro do Palácio das Artes, de 12 de abril a 12 de maio. A mostra Howard Hawks Integral vai exibir 40 longas, a maioria em película. Clássicos como Scarface (1932), Levada da Breca (1938), Jejum de Amor (1940), Sargento York (1941), À Beira do Abismo (1946) e O Inventor da Mocidade (1958) vão alternar sessões com sorvetes fílmicos como Suprema Conquista, A Noiva Era Ele, Hatari! e Rio Lobo. Veja a programação aqui.

Howard Winchester Hawks tinha uma arma no nome, mas não fez apenas westerns e filmes de ação. Dizem as boas línguas que não houve gênero que ele não tenha praticado – e quase nunca em separado. Uma comédia podia ser no fundo um policial; thrillers como Uma Aventura na Martinica ou À Beira do Abismo eram, no fim das contas, histórias de amor; Rio Bravo, classificado como faroeste, era na verdade uma conversation piece. Foi nessa combinação de modelos, sempre buscando a melhor economia dramatúrgica, que o mestre Hawks fez arte sem querer assumir-se como artista.

Seus filmes não são memoráveis pela invenção de linguagem ou pelo posicionamento da câmera. No entanto, um gênio da linguagem e da câmera como Orson Welles o considerava “o mais talentoso entre os realizadores americanos” (apud Bogdanovich). O que fica dos seus filmes é sobretudo o vigor de suas escolhas, a qualidade masculina de suas abordagens, o profissionalismo absoluto que se vê mesmo nos trabalhos mais modestos.

A mostra mineira vai contar também com um curso ministrado pelo crítico Inácio Araújo e quatro palestras. Como agora é praxe nos eventos do gênero, um livro-catálogo será lançado, contendo textos de, entre outros, Bogdanovich, Jacques Rivette, Jonathan Rosenbaum, Rogério Sganzerla e Jean Douchet. Rivette, aliás, é o autor de um dos mais completos perfis sintéticos do cineasta: “Se Hawks encarna o cinema americano clássico, se ele trouxe nobreza a todos os gêneros, então é porque, em cada caso, ele encontrou a qualidade essencial e a grandeza daquele gênero particular, e mesclou seus temas pessoais com aqueles que a tradição americana já havia enriquecido e aprofundado”.  

3 comentários sobre “Trinta dias com Hawks

    • Oi Nelson, eu me referia ao cinema másculo que o Hawks praticava. O ponto de vista masculino é uma constante em sua obra, mesmo quando havia personagens femininas fortes. É o que eu acho, pelo menos.

  1. Sem pretender diminuir a importância do cineasta e muito menos de seus melhores filmes como, por exemplo, “Hatari!”, lembro de ter lido que um ator francês da nouvelle vague (cujo nome agora me escapa, fez filmes com Chabrol ainda nos anos 1950) e que depois tb se arriscou na direção em seu país, ao trabalhar exatamente em “Hatari!” ficou bastante decepcionado com a postura supostamente autoral de Hawks: o diretor teria sido servil a roteiro, atores/astros e produtores do filme, com uma conduta na direção julgada pelo francês como tendo sido apenas de competência artesanal. Bem, o resultado do filme é ótimo, independente do que o francês disse. Idiossincrasia francesa? Ou uma prova a favor da competência artesanal e do resultado de trabalho de euqipe em cinema, contradizendo as teorias francesas de autores idealizados no cinema americano?

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