Déja vu futurista

Há um aroma de déja vu no ar de O Teorema Zero. Depois de Metropolis, 1984, Blade Runner e Matrix, resta pouco de original nessa fábula a respeito de uma sociedade sob estrita vigilância e controle, em que os cidadãos estão condenados à uniformização, a trabalhos repetitivos e à ausência de qualquer resposta para suas indagações existenciais. O que faz desse filme um entretenimento interessante não é, portanto, o que ele conta, mas a forma farsesca e estapafúrdia como conta.

Estamos no reino encantado/mal assombrado de Terry Gilliam, onde o humor sardônico serve de fantasia para vestir questões políticas e religiosas (mais que uma locação, a igreja em que mora Qohen Leth é um ícone da expectativa transcendental do homem de fé). Como nos tempos do Monty Python, Gilliam brinca com a busca pelo sentido da vida. Seria o Teorema Zero a negação de toda ordem e de toda esperança no universo ou apenas mais uma ferramenta de manipulação dos homens pelos macropoderes dissimulados na tecnologia, na publicidade e nas cidades transformadas em parques de diversão?

A mordacidade do filme está nos diálogos ora patéticos, ora espirituosos, ditos por um elenco que sabe equilibrar comicidade e senso de macabro. E aqui não sabemos até que ponto o estilo do diretor interferiu na criação do roteirista Pat Rushin. A concepção visual combina a eletrônica de ponta com soturnas trapizongas mecânicas. Os passeios virtuais do protagonista com sua namorada se dão numa praia tropical que parece saída de algum antigo filme escapista em technicolor. A falta de profundidade nas trucagens digitais gera um estranho efeito, similar ao das velhas retroprojeções e cenários pintados.

Enfim, esta é uma fantasia futurista com gosto de passado. O déja vu da era mecânica é a moeda satírica com que Terry Gilliam trafica sua visão do devir pós-industrial.

P.S. A cópia em exibição no Espaço Itaú de Cinema está com as proporções deformadas. Assisti no Kinoplex São Luiz com som e imagem muito superiores.

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