Infelizmente, nunca li Haruki Murakami, cujos contos minha irmã Monique Gardenberg adaptou para o teatro junto com Michele Matalon. Não sei se isso é bom ou ruim para quem assiste a O Desaparecimento do Elefante, em cartaz até o dia 25 no Teatro Fashion Mall. Só sei que me diverti muito e saí orgulhoso da mana. Deve soar suspeito o que vou dizer, mas acho que a Monique é uma das melhores encenadoras em atividade no país.
Além de sair em busca de materiais contemporâneos e de alta qualidade – Robert Lepage, Neil Labute, Adam Rapp, Murakami –, ela tem a coragem de fazer ousadias e o bom gosto de mantê-las na esfera da beleza. Os cinco módulos de O Desaparecimento do Elefante lidam com relações humanas mais ou menos absurdas e situações que se sustentam no fio da navalha. Um homem desempregado vive assediado por mulheres com demandas as mais estranhas, incapaz de atender a qualquer uma delas. O funcionário de um serviço de atendimento a consumidor se apaixona por uma carta de reclamação. A mulher de um dentista perde o sono por noites seguidas e começa a misturar sua vida com a dos personagens do romance Ana Karenina. Um “mano” maloqueiro paulista e sua companheira, uma japonesinha tipo Harajuku, resolvem assaltar uma lanchonete para se libertarem de uma suposta maldição. Um vendedor de cozinhas planejadas conta a uma jornalista como ele testemunhou o sumiço de um elefante.
Se nos textos originais essas histórias já devem trazer seu teor de poesia, no palco elas se beneficiam de um elenco afiadíssimo, um timming de humor impecável e uma visualização impactante através de recursos relativamente econômicos, com muito uso de projeções. Essa opção resulta um pouco dispersiva no episódio Sono, mas de resto funciona muito bem, criando atmosferas e dialogando com as cenas ao vivo.
Mas o melhor de tudo, para mim, foi ver aqueles textos ganharem corpo de maneira tão intensa, ora pela interiorização dos dilemas de cada personagem, ora pelo extravasamento de ações. Ou mesmo no limite entre interiorização e extravasamento, como no monólogo magnetizante de Kiko Mascarenhas, a que assisti literalmente de boca aberta.
Para saber mais das origens e do processo de criação do espetáculo, deixo vocês com essa matéria de Daniel Schenker no jornal Valor Econômico. De minha parte, fico cada vez mais curioso quanto à primeira vez que Monique levar ao palco um texto brasileiro.
Assino embaixo, Carlinhos. Dramaturgia, atuações, encenação, elenco, trilha sonora – tudo de primeiríssima qualidade. Parabéns para a super-mana.