O documentário que Izabel Jaguaribe fez sobre seu pai, juntamente com Ernesto Baldan, toma a forma de um filme-debate. A trajetória e as ideias do advogado, sociólogo, cientista político e escritor Hélio Jaguaribe são apresentadas não como uma narrativa, mas como uma grande discussão a muitas vozes. Algumas vezes, a discussão até “esquenta” entre dois participantes, embora sempre no âmbito da camaradagem.
O começo assusta, com uma bateria cerrada de considerações filosóficas em torno de uma das máximas de Hélio: “O mundo objetivo não tem finalidade. E o homem é a busca individual de um sentido”. Daí chegar-se à conclusão de que, afinal, tudo é mesmo irrelevante.
Aos poucos, passa-se do debate sobre imanência e transcendência para os planos menos elevados da política e da economia. A figura do intelectual público, que reivindica participação plena na vida do país, é encarnada à perfeição pelo homem que esteve à frente da CEPAL, do ISEB e de uma companhia siderúrgica. Pena que a abordagem não se estenda até a atualidade e nos prive do que Hélio Jaguaribe pensa hoje do projeto “social-democrata” que ele ajudou a configurar para o Brasil.
Vejo no filme também um debate entre a ousadia e o gosto duvidoso. De um lado está a coragem de enfrentar ideias densas sem subterfúgio. Até a narradora Fernanda Montenegro sai da voz off para contribuir diante da câmera com seu pensamento filosófico sobre a arte. Num dado momento, para sugerir a força imantadora da música, a tela se escurece durante os três minutos em que ouvimos uma execução pianística.
De outro lado, temos um tratamento de imagem estranhamente obscuro. Os rostos das pessoas são incrustados numa iconografia confusa em preto e branco ocasionalmente manchado de vermelho. A ilustração do que é dito desfila numa espécie de mural móvel, com alusões à cultura greco-romana, à ditadura militar e a muito mais. Como se não bastasse tanta poluição visual, ainda vemos pequenos insetos correndo sobre as imagens, símbolos da tal irrelevância fundamental de tudo.
Ou seja, a imponência intelectual do personagem recebe a atenção devida, mas o filme coloca tudo numa espécie de museu audiovisual atravancado, árido e, numa palavra, feio.