LOS TERRITORIOS se filia a uma escola de documentários latino-americanos autorreflexivos e auto-ironizantes, na qual se encaixam o colombiano Luis Ospina e o argentino Andrés Di Tella. São trabalhos que frequentemente se referem ao próprio fracasso de suas intenções e procuram desmontar os cânones da verdade documental.
Iván Granovsky é filho do famoso jornalista político argentino Martin Granovsky. Quando criança, ele idealizava o pai como um intrépido correspondente de guerra, mas depois ficou sabendo que Martin nunca cobrira nenhum grande conflito. Resolve, então, partir ele mesmo em busca do “seu front”. Com viagens financiadas pela mãe ou por programas de bolsas, e fazendo bicos para revistas e TVs estrangeiras, ele se manda para lugares como La Paz, Madri, País Basco, Coimbra, Paris, Berlim, Lesbos (Grécia), Jerusalém e Ramallah.
A ideia é aproximar-se de zonas de conflito e de correspondentes de guerra, mas a falta de carisma e de experiência não o ajuda muito. O filme se constitui desse périplo pelas bordas do perigo, entre tentativas frustradas de documentar, conquistar garotas e vender crônicas para publicações. As relações de dependência com o pai e a mãe reforçam o olhar autodepreciativo que Iván lança ao personagem de si mesmo.
O humor documental é perseguido não só através da auto-imagem, mas também da falsificação assumida. Entre os projetos de filmes esboçados por Iván estão uma aventura com amigos argentinos fantasiados de curdos iraquianos e a história de uma dupla que vem a Brasília para entrevistar “o rei do mundo subterrâneo, Michel Temer”.
LOS TERRITORIOS é uma coprodução de Argentina, Brasil e Palestina. Iván viaja muito em dois sentidos. Na geografia e na pretensão de fazer um filme esperto sobre uma obsessão pessoal. Não é ruim acompanhá-lo nessa egotrip, mas, ao final, a sensação de frustração não é só dele. É nossa também.
Junto com Los Territorios está sendo exibido o curta THE BEAST, produzido e dirigido pela sul-africana Samantha Nell e Michael Wahrman, coprodutor brasileiro do longa. O complemento funciona bem pela similitude das falsificações. Estamos numa daquelas aldeias zulus mantidas para turistas na África do Sul, onde performers locais encenam cantos, danças e o cotidiano dos povos tradicionais. É como se flagrássemos os bastidores do parque temático, assim como Jia Zhang-ke fez no seu The World.
Os atores se submetem pacientemente às fotos dos visitantes, enquanto no safári um guia se vira para conter a frustração dos que não veem os animais que esperavam. Como sempre nos parques zulus, há a representação do lendário Rei Shaka. Seu intérprete, porém, está de saco cheio de fazer papéis de negro e participar daquele folclore idiota. Quer desempenhar Shakespeare, em lugar de Shaka. Em torno dele, outros personagens gravitam com suas histórias fabulosas ou prosaicas. A inusitada comédia explora o non-sense e a cenografia do lugar em belíssimas composições de natureza teatral. Um pequeno luxo que passou pela Quinzena dos Realizadores de Cannes.