A relativa discrição com que Toni Venturi se move no meio cinematográfico é inversamente proporcional à forma como os seus filmes instigam o cenário do cinema brasileiro. Para quem quiser comprovar isso, a hora é chegada. Nesta quinta-feira, dia 25, a O2 Play, distribuidora da O2 Filmes, lança a obra do diretor em video on demand (no iTunes, Google Play e NOW).
Trata-se do primeiro acesso massivo à filmografia de Venturi, muito embora ela tenha passado por festivais, cinemas e seja utilizada com frequência em escolas e universidades. Venturi tem se inserido com seus filmes nas mais diversas discussões sobre a realidade brasileira, seja em documentários, seja em ficções. O menu de gêneros é variado, indo do documentário histórico ao “western” político, da tragédia à sátira social.
Seu primeiro longa foi a cinebiografia O Velho – A História de Luiz Carlos Prestes (1996), premiada na segunda edição do Festival É Tudo Verdade. O documentário cobre a trajetória de vida do Cavaleiro da Esperança desde o movimento tenentista, quando se deu o surgimento do mito nos idos de 1920, até sua participação na redemocratização do país. A abertura dos arquivos de Moscou lançou luz sobre fatos da nossa História que sempre estiveram envoltos nas brumas da dúvida e do desconhecimento. Leia aqui uma resenha do filme que publiquei no DVD da Programadora Brasil.
A questão da moradia em São Paulo ganhou de Venturi um documentário movido pelo engajamento e a solidariedade. Dia de Festa (2006), dirigido juntamente com Pablo Georgieff, acompanha os dias que antecederam e sucederam as sete ocupações simultâneas de prédios abandonados ocorridas em outubro de 2004 em São Paulo. São cenas de uma cidade em guerra, ocupada pela polícia e vista através do olhar sensível de quatro mulheres negras, coordenadoras do MSTC, movimento dos Sem-Teto.
Ainda no campo dos docs, o cineasta se voltou para o seu próprio passado em Vocacional, uma Aventura Humana (2011). Como ex-aluno do Ginásio Vocacional Oswaldo Aranha, ele reconta a história dessa experiência revolucionária no ensino em São Paulo. Confira minha resenha do filme. Já em Rita Cadillac, a Lady do Povo, Venturi fez um retrato afetuoso e respeitoso da chacrete mais popular do Brasil. Aqui uma pequena nota sobre o doc.
A ficção de Toni Venturi costuma apresentar dramaturgia sofisticada, capricho técnico e uma mão certeira na direção de atores. Sua mulher, Débora Duboc, é presença frequente com sua capacidade de elevar as personagens a dimensões ao mesmo tempo humanas e épicas. Latitude Zero, que participou da seleção oficial dos festivais de Berlim e Toronto em 2001, traz Débora e Claudio Jaborandy numa história de amor visceral ambientada no coração do Mato Grosso. O filme chama atenção pela intensidade do huis clos e pela extraordinária performance da atriz, premiada em festivais de Kiev e Miami.
Outro filme passado em espaço restrito é Cabra-cega (2004). A vivência da clandestinidade é mostrada pela perspectiva de uma história de amor entre Tiago (Leonardo Medeiros), ex-líder estudantil que optou pela luta armada, e Rosa (Débora Duboc), enfermeira e filha de operário comunista do interior de São Paulo. O filme revela um país amordaçado, vivendo um período de censura, imposições e provações. Cabra-cega levou os prêmios de melhor direção, ator, roteiro, direção de arte e filme do júri popular no Festival de Brasília.
O pacote se completa com o drama Estamos Juntos (2011), estrelado por Leandra Leal, Cauã Raymond, Lee Taylor, Dira Paes e Débora Duboc, além do ator argentino Nazareno Casero. O filme se apresenta como “um passeio pelo universo do acaso, que reinventa e desdobra as possibilidades da vida”. Para a jovem médica-residente Carmen, o mundo começava a moldar-se conforme seus planos. Uma vida independente na agitada São Paulo, ao lado de seu amigo gay DJ, uma aventura amorosa com um impetuoso músico argentino e uma relação de intimidade com um homem enigmático. A aparição de sintomas de uma doença grave faz a vida de Carmem se transformar para sempre.
Ficaram de fora deste lançamento alguns telefilmes e o documentário No Olho do Furacão, realizado com Renato Tapajós sobre a vida privada dos guerrilheiros ativos durante a ditadura – e que serviu como preparação para a ficção Cabra-cega. O mais recente lançamento de Toni Venturi, A Comédia Divina, está sendo lançado em paralelo nas mesmas plataformas e ainda no formato DVD com distribuição da Encripta/Imagem. Nesse último, o realizador desviou suas baterias para a grande mistificação das igrejas evangélicas com base num conto picaresco de Machado de Assis. Leia aqui a resenha.
Clique nos títulos para ver os trailers:
O Velho – A História de Luiz Carlos Prestes
Latitude Zero
Cabra-Cega
Dia de Festa
Rita Cadillac – A Lady do Povo
Estamos Juntos
Vocacional – Uma Aventura Humana
A Comédia Divina