Os Prêmios César desse ano foram quase todos divididos entre dois filmes que representam dois ideais do cinema francês. 120 Batimentos por Minuto levou seis troféus para a vertente do cinema de autor, politicamente significativo e inspirado por uma pulsão documental. Outros cinco prêmios ficaram com NOS VEMOS NO PARAÍSO, exemplo de superprodução voltada para o entretenimento de qualidade.
Baseado no romance de Pierre Lemaitre, que lhe deu o Prêmio Goncourt, o filme começa como um épico na I Guerra Mundial e aos poucos desliza para uma comédia dramática do pós-guerra. Dois soldados se salvam mutuamente no front e interligam seus destinos dali para a frente. Um deles, desenhista e filho de banqueiro poderoso, tem o rosto desfigurado e prefere passar à clandestinidade. O outro, pobretão, torna-se seu agente e cúmplice de negociatas.
Enquanto a França se recuperava do conflito, muitos tentavam se recuperar mais rapidamente faturando em cima dos mortos. É o caso dos dois amigos, assim como do tenente que assume desde cedo o papel do vilão. À medida que a história desfia seu novelo bastante romanesco, todos os personagens centrais acabam envolvidos num só imbroglio familiar.
Nessa fábula amoral, solidariedade e esperteza convivem sem problemas, e os laços de família falam mais alto que a justiça e o ressentimento. Ou seja, é o tipo de material que pisca um olho para a plateia e consegue agradar a todos.
O diretor (e ator principal) Albert Dupontel demonstra uma verve espetaculosa, imprimindo um ritmo veloz e enfatizando a tipologia até o limiar da caricatura. Ele próprio lembra às vezes Buster Keaton, ao passo que Nahuel Pérez Biscayart recorre com frequência à pantomima por trás das máscaras excêntricas com que cobre o rosto. Nahuel, por sinal, ostenta a façanha de estar nos dois filmes franceses mais premiados do ano. Por 120 BPM ele ganhou o César de melhor ator promissor e melhor ator do European Film Awards.